domingo, 28 de outubro de 2012

1Q84 Vol. 3 - Haruki Murakami



Aomame vai olhando a lua e esperando por Tengo. Ela matara o velho e prepotente líder da Vanguarda; na hora da morte ele prometera-lhe que Tengo se salvaria se ela se suicidasse. Mas isso seria um paradoxo porque Aomame tem uma missão mais importante: a última e mais decisiva das missões – esperar por Tengo.
Neste terceiro livro deparamos com uma nova personagem: Ushikawa, o detetive ao serviço da Vanguarda para tentar capturar Aomame; mas ao contrário do previsto, a perspicácia do detetive levá-lo-á apenas até ao amor entre Tengo e a assassina justiceira. Aliás, a característica que mais surpreende neste terceiro livro é o romantismo em que Murakami caiu; alguém comparou já este livro ao Romeu e Julieta. Não vou tão longe porque, ainda assim, a obra de Murakami tem dimensões maiores que a estória romântica. Mas que é o livro mais cor-de-rosa do japonês, isso é inegável.
Mais do que em qualquer outra obra de Murakami está aqui bem patente um confronto quase titânico entre o bem e o mal. Este maniqueísmo surge associado a um tom romanesco e a um estilo mais narrativo do que nos seus livros anteriores, tornando a escrita fluente e agradável. É talvez o livro mais fácil, mais direto e atrativo do escritor nipónico. Longe está a escrita filosófica e profundamente mística de Kafka à Beira Mar, por exemplo. No entanto, não quero com isto estabelecer qualquer hierarquia nem muito menos desvalorizar este livro. Esta diferença em relação às obras mais antigas de Murakami só comprova a enorme versatilidade do escritor que, de uma vez por todas, merece o Nobel.
Mas voltando ao maniqueísmo a que me referia acima: não deixa de ser curioso que o Mal nos apareça aqui associado a uma seita religiosa. Sinal dos tempos?
Em suma: em termos de gostos pessoais, agradou-me mais o primeiro volume desta série. No entanto não podemos avaliar estes três livros separadamente; eles constituem um todo onde Murakami percorre diversos estilos de escrita. Mais místico no volume segundo, com um interessante tom de literatura fantástica que curiosamente desaparece no volume três, mais narrativo. Penso que o primeiro episódio é o mais bem conseguido. Sem chegar aos patamares de excelência que já atingiu noutros livros, Murakami presenteia-nos aqui com três livros de inegável qualidade literária, difícil de igualar por qualquer outro romancista atual.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A Rapariga Que Roubava Livros - Markus Zusak



Qualquer coisa era melhor do que ser judeu. E assim Liesel era feliz na Alemanha nazi. Max, o judeu, é o perseguido, atormentado, sacrificado. O representante de um povo martirizado. Mas este livro não é apenas mais um a denunciar o holocausto; ele oferece-nos a perspetiva do povo alemão; ou melhor, dos pobres que Hitler também fabricou na Alemanha; é o desmistificar de uma ideia feita que ainda tem adeptos hoje em dia: de que Hitler enriqueceu a Alemanha. Nada de mais errado. A Alemanha de Hitler não era a Alemanha da riqueza; era a da inveja e da loucura que levou ao anti-semitismo e ao imperialismo absurdo.  
O livro é o elemento de união entre Liesel e o pai; é o cimento da amizade. Aos poucos, os livros vão-se transformando no símbolo da resistência, da esperança, da vida. Qualquer que seja o livro: um manual do coveiro, por exemplo. Ou até o Mein Kampf cujas páginas Max vai pintado de branco e reescrevendo numa bela mensagem de esperança.  
Mein Kampf parece ser o livro que acompanha o mal, a tristeza. Afinal há livros maus. Mas para Max aquele era o melhor dos livros porque lhe havia salvado a vida. 
Max reescreveu 13 páginas do mein kampf; pintou-as de branco e escreveu sobre a amizade.  
Rudy, o jovem amigo de Liesel é, a meu ver, a personagem mais fascinante deste livro; para ele, Jesse Owens é sempre o símbolo da liberdade. Simboliza a luta pela liberdade; a resistência ativa. A força do bem.  
Este livro não é uma obra prima; o tema, mais do que explorado por escritores e historiadores, acaba por fornecer um ambiente em que é fácil chegar ao coração dos leitores. Por outro lado, embora o estilo e a linguagem seja de uma beleza avassaladora, não prima pela originalidade. Por várias vezes, ao longo da leitura, me fez recordar O Leitor, de Bernard Schlink, esse sim uma obra prima da literatura do holocausto.  
No entanto, fica a originalidade de certas ideias: muitos alemães, a maioria, foram mais vítimas que culpados. Eles escolheram Hitler. Mas mereciam morrer por causa disso? Talvez o seu maior crime tenha sido um mero encolher de ombros… 

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Mansfield Park - Jane Austen



Sinopse:
A tímida Fanny Price vive desde criança com parentes ricos em Mansfield Park, uma bela propriedade no interior da Inglaterra. Com o tempo, aproxima-se de Edmund, único entre seus primos que compartilha sua paixão pelos livros. A chegada dos irmãos Henry e Mary Crawford à vizinhança encanta todos os habitantes de Mansfield Park – exceto Fanny, a única capaz de perceber a imoralidade dos recém-chegados. Dotada de uma fantástica ironia e uma incrível capacidade de observação, Jane Austen retrata a sociedade inglesa do início do século XIX. Com sua trama repleta de conflitos sentimentais e personagens frívolas, sonhadoras e ambiciosas, este romance destaca o triunfo da verdadeira virtude sobre as aparências. Esta edição de bolso teve tradução de Mariana Menezes Neumann.

Comentário:
Não sendo eu um apreciador, nem sequer leitor dedicado de Jane Austen, decidi adquirir e ler este livro devido a uma afirmação que consta da contracapa, onde se diz que este é um dos livros menos admirados pelos apreciadores de Jane Austen. Se os apreciadores não gostam, talvez eu goste - foi a minha estranha perspectiva  Depois de ter saído francamente desiludido da leitura de Orgulho e Preconceito, tinha esperança de encontrar algo de diferente neste livro.
E, na verdade, este é um livro bem diferente. A crítica social está aqui bem patente; Austen vivia um pouco à frente do seu tempo, denunciando a escravatura, por exemplo (o pai adotivo de Fanny tinha negócios nas colónias que envolviam mão de obra escrava).
Mas são, acima de tudo, os casamentos de conveniência criticados pela autora. Fanny é vítima dessa mentalidade e recusa-se a aceitar esse tipo de casamento. Ela é uma voz rebelde na Inglaterra vitoriana conservadora. No entanto, a fragilidade da personagem deixa o leitor algo perplexo: por um lado ela rejeita a submissão mas, por outro, não tem a força que os leitores assíduos de Austen admiram nas suas principais personagens femininas; ela é rebelde mas a rebeldia permanece interiorizada e o que prevalece é a força do conservadorismo de Sir Thomas (o pai adotivo) ou da abjeta tia Mrs Norris.
A religião luterana é um dos alvos principais da crítica de Austen; por um lado, é dada liberdade de casamento aos sacerdotes, mas por outro eles são censurados por qualquer relação amorosa e a sua vida estará sempre condicionada pela permanente vigilância dos olhares conservadores.
Enfim, trata-se de um livro que se lê com muita facilidade, constituindo até uma leitura agradável mas em que falta algum fôlego  o mundo de Austen parece sempre demasiado pequeno para as suas personagens: a crítica social é a sua principal preocupação e esse propósito quase obsessivo limita bastante o âmbito dos seus romances.
Por outras palavras, ainda não foi desta vez que Jane Austen me convenceu.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

A melhor leitura de Setembro: Servidão Humana

Embora não tenha lido muito, em Setembro houve de tudo: um barrete de John Updike, uma estória engraçada sobre as profundezas do império romano, um clássico divertido de Alexandre Dumas.
Mas, acima de tudo, dois destaques:
1- uma pequena obra prima da melhor literatura portuguesa contemporânea, nesse singelo e belíssimo Amor e Liberdade de Germana Pata-Roxa, do cada vez mais surpreendente Fernando Évora.
2- A confirmação de uma obra genial que, inexplicavelmente me estava a passar ao lado ao longo da minha vida de leitor. Uma obra prima, um livro cheio de inteligência, sensibilidade e humanismo: