Sinopse:
Um representante de uma pequena empresa inglesa de
aspiradores, lojista quase arruinado, vive angustiado com os eternos motins de
Cuba. Os negócios vão mal, muito mal e Milly, a sua bela filha, atormenta-o com
os seus caprichos.
Então, sob a forma de Mr. Hawthorne, um enigmático
cavalheiro que faz apelo ao seu sentido patriótico, explica-lhe coisas tão
estranhas como o modo de usar um livro de cifra, ou tinta invisível, ou a
utilidade das chaleiras elétricas para a abertura de cartas - a tentação surge.
Pouco a pouco, como aliás explica Hawthorne aos seus superiores hierárquicos em
Londres, a imaginação do pobre comerciante põe-se a trabalhar. E como, no nosso
mundo, a realidade não é coisa que se enfrente, a imaginação assim estimulada
virá a revelar-se mais verdadeira do que o próprio real…
Comentário:
Graham Greene é, definitivamente, um dos melhores contadores
de estórias da literatura do século XX. Na verdade, este escritor católico
inglês deixa-nos sempre sem fôlego perante uma escrita tão fluente e tão
“limpa”, despojada de qualquer adorno desnecessário ou divagação estéril.
Esta escrita sintética, onde nada é inútil ou dispensável,
nunca cai, no entanto, naquele laconismo da frase curta, estilo SMS que por
vezes encontramos por aí. Greene consegue, a meu ver, o equilíbrio perfeito na
economia da escrita.
Este romance é, em grande parte, uma espécie de paródia à
euforia quase histérica da espionagem internacional nos tempos da guerra fria.
No entanto aqui encontramos alguns estereótipos do humanismo literário, muito
bem explorados:
O agente secreto que é personagem principal da estória, Mr.
Wormold, não passa de uma caricatura do espião, um personagem ao mesmo tempo
credível e risível, com um toque de ridículo. No entanto, é impossível não
simpatizar com ele, que engana os ingleses sistematicamente inventando
situações de espionagem que o deixariam visto como um espião genial.
A filha, Milly, é uma adolescente boémia, desmiolada, mas
católica e até algo beata; trata-se de uma personagem excelente por causa deste
contraste que Greene aproveita muito bem para deixar um certo traço de cinismo
crítico.
Mas o aspeto que mais agrada neste livro é sem dúvida do
sentido de humor, bem na linha daquela que é, a meu ver a sua obra prima (O
Cônsul Honorário). Trata-se de um humor sarcástico, cínico e perfeitamente
encaixado no período em que Greene escreveu: o início da guerra fria. Um
exemplo bem expressivo: Wormold, para satisfazer os ingleses, desenhou as peças
de motor de um aspirador, numa escala muito maior. Os ingleses adoraram o seu
trabalho genial porque acreditaram tratar-se de terríveis máquinas de guerra
russas instaladas pelos rebeldes apoiados pelos russos. Obviamente tudo se
complicará quando os ingleses exigem fotografias…
Em suma, estamos perante uma obra leve, que faz rir e
sorrir, num estilo fácil e desenvolto mas que não deixa de refletir um lado
sério da questão: a guerra fria e o jogo por vezes ridículo da espionagem
internacional que marcou uma época.
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