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segunda-feira, 3 de novembro de 2014

O Diabo dos Políticos - Fernando Évora, João Pedro Duarte, Miguel Almeida, Vítor Fernandes


Comentário:
Se este livro se chamasse O Diabo dos Benfiquistas também não calhava nada mal. 
Quatro bons escritores, quais quatro cavaleiros do Apocaliptro, quatro escribas cheios de sentido de humor e de espírito crítico deixam aqui bem claro que ninguém é perfeito: aquele tom encarnado de princípio a fim não agradou nada aqui ao bracarense :) Até a cor da capa foi escolhida a preceito: vermelha como Lúcifer e como o Benfica. 
No entanto, daqui para a frente escrevei apenas na condição de leitor, abandonando, embora a custo, a minha honrosa qualidade de vermelho com mangas brancas.
E, enquanto leitor, tenho de confessar que me diverti imenso ao ler o diabo do infólio. Para já, tudo começa com a originalidade de um livro que, escrito a quatro mãos, não perde uma linha narrativa coesa. Depois, vem ao de cima o imenso sentido de humor dos autores, apimentado por aquele espírito crítico que, como se diz aqui no Minho, leva tudo a eito, como a espada do rei Afonso curando dores de cabeça à moirama (sem acepção futebolística, note-se).
Mas não se pense que este é um livro escrito a brincar. Há aqui questões muito sérias, cheias de motivos de reflexão. Questões quase transcendentais, mesmo. Por exemplo: seria Adão alérgico a maçãs? Será que todos os demónios, a caminho do Parlamento, têm de passar pelo estádio da Luz? Haverá forma, mesmo que satânica, de quebrar a hegemonia do Norte? Terá o Antipapa D. João Relvas I, alguma vez, poder para defrontar o Papa do Norte? O verdadeiro Inferno fica na Alemanha ou em Boliqueime?
Estas e muitas outras questões podiam fazer deste livro um clássico da literatura universal e dos seus escritores candidatos ao Nobel. Mas não, porque eles até escrevem benzinho mas ousaram maldizer. Renegaram o Coelhinho da Páscoa e também o da Duracell. Enfrentaram descaradamente o Anjo da Guarda e o da Polícia. E o de Castelo Branco também. Por tudo isto, caros autores, se estas linhas tiverem a felicidade de ler, saibam que só uma via vos poderá conduzir à redenção: se um qualquer subsecretário de Estado da Cultura vos ler e amaldiçoar, as portas do Nobel podem ficar abertas. E as do Inferno também.
Termina aqui a primeira parte do meu comentário.
Segunda parte:
Este livro é uma paródia total no melhor dos sentidos. Sarcasmo, crítica, sátira e montes de gargalhadas. Parabéns e obrigado por este divertimento.

Sinopse
Um país chamado Portugal atravessa uma crise e está sob tutela de uma troika. Apesar da maior parte da população viver no limiar de pobreza, uma pequena elite desgoverna a nação, indiferente ao sofrimento dos seus conterrâneos. O Diabo, entediado pela espera de mil anos, vê a sua oportunidade de conquistar, como deputado de um partido de direita, este novo inferno com sede na Assembleia da República. Mas o que o Diabo veio encontrar envergonha até um Príncipe das Trevas. E, de natureza rebelde e contestatária, acaba por se apaixonar por uma deputada da ala contrária… Neste romance, os autores abordam despudoradamente religião, política, sexo, morte… e futebol, pois claro…

sábado, 16 de junho de 2012

O Lugar das Coisas - Miguel Almeida


Se a arte imita a vida ou vice-versa
Na arte ou na vida
Quem imita o quê?
Talvez em síntese se possa resumir a vida na arte de saber viver. Quase assim se abre o livro.
Uma poesia feita dos dias; dos atos quotidianos, uns de rima fácil outros que teimam em escurecer a vida. Uma poesia feita dos dias e das noites, de suores e das lágrimas, dos risos e de explosões de prazer, embora serenamente, dos tesouros incontáveis. Do tudo e dos nadas que nos rodeiam.
Como uma flor, que nasce
No lixo, para crescer e florescer
Alimentada nestes espantalhamentos.
E dos dias se levantam por vezes, em explosão, excessos e loucuras, arrebatamentos de poeta, gente normal afinal, gente que percorre o tempo de nascer, viver e morrer, gente que nasce para se fazer pó da terra. Mas, pelo meio há o sol, o mar, o céu e a alegria. A poesia. A poesia que não tem dono, não tem rei nem senhor. A poesia que é liberdade, sonho e vida.
E o homem o poeta o artista o que cria;
…e nisso há poder. Há divindade, há a magia de fazer nascer, de fazer viver. De fazer poesia.
Mas, afinal de contas, triste ilusão, a vida assim cantada em verso não é mais que a alma só de um poeta; um grito ou talvez apenas uma voz suave de alguém… Alguém: um mundo no singular. Sobre quem o cientista berra: Subjetivo!!! No entanto o mundo é inteiro na alma de um só: o poeta. Daí advém o lamento de quem é julgado “difícil”… porque difícil é entender quão simples é a alma.
Fácil é afinal viver e deixar viver. Ler e deixar sentir. Pensar e deixar pensar. E sonhar, acima de tudo.
Livro de capa azul, O Lugar das Coisas é uma espécie de céu, altar em que se celebra a vida, o amor, o lado solar da existência. Nestes tempos sombrios de crise e medo, a poesia de Miguel Almeida emerge como um fio de luz brilhante, ofuscante, por sobre esta vida de autómatos que todos, mais ou menos, carregamos como um fardo. Miguel Almeida, desdizendo o poeta que finge, é o poeta que faz nascer a luz da esperança, de uma vida onde (ainda) há futuro (sonho).
Atrevo-me a afirmar que este é o livro mais pessoal de Miguel Almeida; mais pessoal e talvez mais pessoano; mas deixo essa questão para os que sabem de poesia. Eu, que não sei de poesia, achei estas rimas de extraordinária beleza; de uma musicalidade muito bem conseguida e, acima de tudo, de uma sensibilidade pessoal tocante.

Próximo comentário: Governo Sombra, de Casimiro Teixeira

domingo, 17 de abril de 2011

Ser Como Tu - Miguel Almeida

Eu, aprendiz, me confesso: não sou perito em poesia, nem sequer fui alguma vez apreciador do género. Sobrevoei os clássicos, movido pela obrigação escolar, mais nada. Tive sempre um pequeno encanto pela Mensagem de Fernando Pessoa mas, fora disso, mantive uma distância consciente mas algo cobarde em relação aos poetas.

Um dia caiu-me do céu em pára-quedas um livro de Miguel Almeida. Li-o com esforço, dada a minha ausente (ou asfixiada) sensibilidade poética. Deixei-me levar pelo esforço e valeu a pena.
Este é o segundo livro de Miguel Almeida que leio e desta vez o esforço foi menor, talvez porque começo a ressuscitar para a musicalidade das rimas e para a sensibilidade dos versos.

Dez conjuntos de onze poemas fazem este livro em que há alegria e solidão, tristeza e intimidade, suavidade e rispidez.
Há até um auto-retrato, talvez brincadeira, servida com humor; o auto-retrato de um poeta que diz não saber se nos mente:
“Deidades! Não devoto para um só Deus o voto
Não sou esquisito. Prefiro mil, se forem mulheres
Pois ser ateu, não vem pró caso de nisto ser expedito.”

Simples, sensível, directo, positivo (sem lamechices).
Pessoal, íntimo, musical.
Suave como quem reza.

Por vezes, a solidão:
“O Caos das proximidades,
Tão próximas,
Afastam-me para longe,
Tão longe de mim.
Mas, agora, entregue a mim próprio
Tenho a sensação de estar só,
Acompanhado, na verdade fiquei tão só.”

Outras vezes, o sorriso da vida:
“E há uma flor no jardim, que me (a) guarda
Esperando paciente por mim, outra vez vigoroso”.
As palavras sobrevoam a alma, as viagens sucedem-se nas nuvens dos sentimentos que percorrem os dias. E o leitor, de início hesitante, vai inspirando os sons que descem ao fundo da alma. E começa a fazer sentido: ler poesia é sentir. Sentir a poesia não é como quem lê. É como quem respira sensações e sentimentos: inspira-os, absorve-os e expira uma espécie de paz.
Ler Miguel Almeida é também uma viagem no mundo reservado da alma:
“Por que é à volta de si mesmo,
Que é mais necessário e urgente viajar.”
E para o fim da viagem há a morte, ou melhor, a vida:
“Na angústia da minha prisão,
Não como ser que nasce para a morte,
Mas como ser que existe,
Resistindo e persistindo, sobre a morte”

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O Templo da Glória Literária - Miguel Almeida

Partindo de mim para além, de lá para a mim retornar sempre.

É assim a poesia, uma viagem do interior para além de limites imagináveis.
Porque nada é póstumo, os Imortais vivem e escrevem neste livro de M. Almeida, transportados pela voz da sua caneta.
No entanto, não são os poetas Imortais que falam pela voz de M. Almeida; é M. Almeida que se faz ouvir (por vezes gritando outras gemendo ou ainda sussurrando) na escrita do poeta de hoje.
É a voz viva do poeta vivo, vivo como os Imortais que se ouvem também eles. Homero em uníssono com Sophia, Solon de mãos dadas com Cesariny.
Vivos, todos vivos.
Mortos são alguns que vivem e não cantam nestas trovas.
E é com os Imortais que M. Almeida vive porque se faz ouvir neste livro.
Ler este livro é expor corpo e alma ao contágio. Sim, a poesia é contagiosa: dos Imortais para M. Almeida; de M. Almeida para quem lê.
É um contágio que liberta porque poesia é liberdade.
A poesia é a “dor do deus” (pg. 84)…

Este é o primeiro livro de poesia que coloco neste blogue. Se exceptuarmos alguns poemas de Fernando Pessoa, posso dizer que não gosto de poesia. Nunca gostei. Mas adorei este livro, que é um livro de poesia. Porquê? Não sei… talvez porque a poesia de M. Almeida me tenha dado este prazer imenso de viajar pelos Imortais mas também pelas palavras e pelos sons.
Sim, os sons; as letras de M. Almeida soam por vezes como música. Como disse Fernando Pessoa, citado neste livro: “a poesia é uma música que se faz com ideias e por isso com palavras”.
De resto, fica a liberdade.
Almeida escreve como quem voa.
As palavras viajam e as nossas ideias sobrevoam a alma de quem escreve.
Passeiam pela sabedoria da Grécia antiga, num tributo (que nunca pagaremos totalmente) aos clássicos.
Uma sabedoria que em excesso já não é sabedoria; é talvez prazer ou poesia.
Com os Imortais vivemos ao longo das páginas.
Com exaustão; a vida “esmurrando o amor” (pg. 51).
O amor… o delírio dos poetas… mas muito acima disso há a vida!
E a poesia de M. Almeida é, acima de tudo, uma poesia viva.
Livre.

(Também publicado no blogue Destante)