Um enredo sem linha de rumo preciso navega num tempo sem definição, ondeando entre memórias e prenúncios, desprezando a linearidade, a lógica. Como se ao longo da estrada 66, como se caminhando descalço sobre o alcatrão das estradas do Iowa, como se sem destino nem rumo certo...
Respira-se o desprezo pelo concreto, a recusa do próprio tempo. O simbolismo, intenso e sempre presente, enreda-se permanentemente numa linguagem barroca, de formas por vezes sublimes mas nunca frívolas.
Jogos de palavras, simples prazer da escrita e da leitura. Um grito colectivo de revolta: uma família apodrecida pela América da falsa prosperidade, rodeada de negros acorrentados à humilhação de ter nascido. Personagens enlouquecidas, devassas, horríveis, infelizes, perdidas num vazio de humanidade.
E a Disley… a criada negra desgraçada e feliz… normal.
Benji é louco, Jason alucinado, Quentin lunático, e... um bando de pretos.
Faulkner constrói assim um quadro quase sem nexo, quase sem sentido, como a vida. Quando chegamos ao fim as estórias ganham, finalmente, forma e sentido. Mas nessa altura fica-nos na mente a frustração de não haver mais páginas… como se todos os Compsons tivessem morrido de súbito. Apetece então voltar ao início… como na vida: uma circunferência que nunca se fecha e assim se transforma em espiral… perpetuamente… sem tempo…
Sem dúvida (pelo menos na minha opinião), um dos melhores livros de toda a história da literatura mundial.
Para ler e reler...
1 comentário:
Adorei o Blog.Espero uma resenha do livro Enquanto agonizo,de Faulkner. Esse autor e obra são especiais para mim.
Enviar um comentário