quarta-feira, 1 de junho de 2016

Em Busca do Tempo Perdido - vol. 3 - O caminho de Guermantes - Marcel Proust


Comentário:
Este volume apresenta-nos já um narrador totalmente adulto; as paixões juvenis, por Gilberta e por Albertina parece terem ficado para trás. Há neste livro uma visita de Albertina que nos revela um amor sem compromisso mas também sem laços fortes – o encontro limita-se a beijos na face. 
A amizade por Saint-Loup, por seu lado, fortalece-se, mas o narrador não esconde o interesse que ela envolve; na verdade, ele utiliza essa amizade para chegar perto da senhora de Guermantes, que é uma espécie de ídolo. A partir daí, quase todo o volume é dedicado à descrição da vida social na alta aristocracia. Se nos volumes anteriores ainda era visível alguma crítica social, aqui fica bem clara a admiração entusiasmada do narrador por essa alta sociedade, essencialmente nas pessoas da Sra. De Guermantes e na marquesa de Villeparisis. 
Antes de “mergulhar” nesta alta sociedade, Proust descreve-nos a relação de Saint-Loup com a sua apaixonada, Zezette. Esta, tal como Odette no primeiro volume, é apresentada como a mulher pérfida, malévola, capaz de torturar psicologicamente o apaixonado e de aproveitar as suas fraquezas em proveito próprio.
Depois o autor presenteia-nos com centenas de páginas dedicadas à alta aristocracia, com um enfoque muito acentuado no salão da Sra. de Guermantes. Se, por um lado, podemos queixar-nos de uma prosa demasiado enfática que se torna mesmo fastidiosa nessas descrições, por outro lado, ficamos necessariamente deleitados com a imensa capacidade descritiva do autor que não precisa de um enredo muito emocionante para manter a atenção do leitor.
A expressão que ainda hoje se usa “conversa de salão” para designar um diálogo sem grande conteúdo tem provavelmente origem nestes salões da velha nobreza onde, na ausência de meios de comunicação social, se conversava ao serão. O salão da Sra. de Guermantes é-nos apresentado como um local onde reina a inteligência, ao contrário de outros salões onde a maledicência tinha lugar de destaque. A duquesa era uma mulher inteligente e culta; possuía até uma espécie de inteligência superior a que chamavam “espírito”. A própria personagem principal, que é também o narrador, como que se ofusca perante a preponderância da duquesa na narrativa.
Ao longo de todo o livro o caso Dreyfus toma um lugar importante; trata-se de um processo judicial onde um judeu era acusado de traição à pátria e que se revelou mais tarde uma fraude, uma vez que a acusação se baseou em documentos falsos. Mas o caso despertou uma onda de xenofobia que dividiu a França e é nítida neste livro a tomada de partido da aristocracia contra Dreyfus, numa clara manifestação de anti-semitismo; mesmo pessoas inteligentes como a duquesa de Guermantes aceitavam a inocência de Dreyfus mas não deixavam de, socialmente, manifestar o seu anti-semitismo.

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