A leitura como testemunho de um amor inexplicável, intenso e estranho. Um jovem de 15 anos que lê em voz alta para uma mulher de 36, que ama ardorosamente. Um adolescente sonhador e uma mulher bela mas autoritária. Uma personalidade em formação e um espírito enigmático, formado num passado misterioso e agora plasmado no silêncio de quem ouve ler.
Para Hanna, o amor carnal é uma forma de assegurar um presente fugaz, refúgio de quem vive perdida no passado; “a tua vida inteira numa hora”…
Todo o enredo se constrói em torno de um tema complexo e marcante para a Alemanha da segunda metade do século XX: a justiça para os criminosos de guerra, um dos grandes dilemas éticos do pós-guerra. Este livro comprova até que ponto o Holocausto nazi está ainda presente na consciência alemã de uma forma profunda e intranquila.
Para a geração do Leitor, não se tratava apenas de julgar criminosos, mas sim de julgar toda a geração dos próprios pais. Hitler, responsável pela morte e tortura de milhões de pessoas havia sido eleito e apoiado pela maioria dessa geração que agora é julgada; essa tinha sido a geração que executara as ordens de Hitler. Até que ponto, no entanto, é legítimo julgá-los? Até que ponto se trata de vontade de praticar a justiça ou apenas exorcizar a culpa e apaziguar a consciência?
Compreender a geração dos pais torna-se incompatível com a necessidade de julgar e condenar. E Hanna representa a geração dos pais. Amá-la ou julgá-la? É a grande questão.
Apontar o dedo aos culpados não liberta, não apaga a culpa colectiva. Mas torna o sofrimento e o remorso mais suportáveis.
Na segunda parte do livro, um novo dilema: o Leitor conhece um segredo de Hanna que a pode salvar. Mas, bem ao jeito da literatura alemã, Schlink coloca-nos perante um este dilema ético: até que ponto é legítimo revelar um segredo contra a vontade da própria pessoa que, com essa revelação pode ser salva? Poderá esse gesto “salvador” compensar a invasão da dignidade e da liberdade do ser humano?
Se bem que de leitura agradável e fluente, este livro deixa um tom nostálgico no final. O remorso prevalece. A culpa é insuperável. Amar ou castigar não eliminam a culpa nem acalmam a consciência. Culpa por ter amado; culpa por ter castigado.
No final, a grande mensagem parece ser esta: punir é uma tentativa vã de libertar a consciência. A culpa sobrevive. Não se elimina de uma geração para a outra, apenas se transfere. Os acusadores tornam-se vítimas da própria acusação.
10 comentários:
Viva Manuel.
Eu tenho um terrivel problema. Quando vejo um filme baseado num livro, muito dificilmente leio o livro depois.
Foi o que aconteceu com o "Leitor". Vi e gostei do filme, mas e como é normal, admito que o livro vá mais além.
Eu amei o filme e amei o livro.
Que mais dizer (tu já disseste todo o resto)?
Bjs
Oie...
To passando para dizer a vc que tem um selinho para vc aqui: http://kezialobo.blogspot.com/2010/01/mais-uma-selinho.html
Desejo tambem uma otima noite e uma bela semana... XD
Este foi um dos livros que muito gostei de ler. Não só pela temática histórica, mas também pela relação que se desenvolve entre os personagens: amor, saudade, sacrifício...
Em relação ao tema histórico, este livro faz, a meu ver, um grande alerta em relação ao que se passou na Alemanha de Hitler: Toda aquela geração na Alemanha e fora desta teve a sua parcela de culpa pelo que lá se passou uma vez que todos tinham conhecimento dos actos praticados e nada fizeram. Culpar, condenar? Quem? Todos foram culpados!
Vi o filme após ler o livro, gostei, mas logicamente o livro tocou-me muito mais.
Um abraço
Caro Cardoso:
Atrevo-me a escrever um comentário sem ter lido o livro, baseando-me apenas naquilo que sei dele a partir do filme.
A propósito da "culpa alemã", parece-me ser avisado distinguir diferentes situações: 1) a culpa daqueles que. sabendo das perseguições aos judeus (e aos ciganos, aos homossexuais, aos comunistas...) não tiveram a coragem de manifestar a sua oposição; 2) a culpa dos que apoiaram essas perseguições sem, no entanto, terem participado nelas; 3) a culpa de quem participou activamente na organização das deportações e no funcionamento dos campos de extermínio; 4)a culpa dos responsáveis políticos pela chamada "solução final". Não me parece correcto meter toda a gente no mesmo saco.
Hannna Schmidt, a personagem central do livro, pertence obviamente ao 3º grupo, o daqueles que procuraram justificar-se afirmando que se limitaram a cumprir ordens. Triste justificação, aliás já denunciada por Hanna Arendt no seu livro Eichmann em Jerusalém, onde defende a sua tese acerca da "banalidade do mal". De facto, os carrascos que conduziram à morte milhões de pessoas não eram necessariamente sádicos ou ideologicamente fanáticos. Muitos (a maioria?)eram pessoas normais, eventualmente bons pais de família, que cumpriam zelosamente as suas obrigações profissionais. Bons funcionários para quem o cumprimento das ordens recebidas estava acima e dispensava qualquer juízo ético. E, no entanto, sem os serviços desta mão-de-obra barata, toda a pesada logística e o funcionamento requerido pelo holocausto não teria sido possível.
Julgo que Hanna Schmidt se terá apercebido da dimensão da sua culpa e, por isso, terá decidido expiá-la duma forma tão radical.
Só assim compreendo que se tenha dado como autora do relatório que pretendia justificar a prisão de centenas de judeus numa igreja em chamas, quando, nessa época, era analfabeta; que tenha preferido o suicídio à libertação, depois de cumprida a sua pena; e que tenha encarregado a filha de uma das suas vítimas de dar o melhor uso possível às suas economias.
António Cruz Mendes
Eu amo essa história!
Tão profunda, tão intensa, tão inspiradora... ainda não li o livro, vi o filme e foi digno de todo crédito!
Continua com ótimas dicas, Manuel!
Abraços
Olá Iceman
passa-se exactamente o mesmo comigo; nunca li o Nome da Rosa, a Lista de Schindler, Quo Vadis, Ben-Hur, e tantos outros por ter visto os respectivos filmes.
Pelo contrário, leio primeiro o livro, não resisto a ver o filme. Curioso, não?
Kézia, obrigado pela atenção :) Grande gentileza, a sua :)
Paula, concordo. Com motivos mais ou menos justificáveis, a conivência foi um forma de culpa.
Olá Cruz Mendes
é um grande prazer ver-te aqui neste modesto cantinho!
É claro quem, na globalidade concordo contigo. No entanto, este é um livro de ficção que, obviamente, está muito longe de fazer uma análise sociológica ao problema. Há uma história pessoal que, no entanto, concretiza esse problema humano tão complexo como é o sentimento de culpa.
Hanna procura expiar a sua culpa, concordo. No entanto, o problema que Schlink nos aponta vai bem mais longe: a nova geração cede mesmo à tentação de "meter tudo no mesmo saco". Não é Schlink quem o faz; é a geração do pós-guerra que, em ultima análise, faz o julgamento dos pais.
Um abraço, caro amigo.
Optei por ver o filme, muito embora depois de o ver tivesse ficado tentada a comprar o livro, por este abordar a temática do Holocausto. Claro que depois acabei por não o adquirir. Sabia que iria ficar eternamente na estante à espera de ser lido... Ou não lido.
terminei hoje o leitor, um livro que me deu especial prazer... uma vez mais (e tal como Equador) LOL á certas historias que não se explicam mexem conosco. e assim foi com o leitor.
embora as suas poucas paginas e curtos capitulos se lessem em 1 hora, o leitor, pediu-me que o lesse devagar, o mais engraçado é que mesmo assim não deixei de pensar nele, creio que o final (as ultimas 15 paginas) valeram por todo o livro. o segredo de hanna era previsivel, mas não esperava aquele desenlace. quanto ao desfecho foi contraditorio, sem bem que queria que assim acabasse, ao mesmo tempo senti uma nostalgia, de tal forma grande, que gostaria que final se reescreve-se. a livrinhos assim, que mexem desta maneira. não são estes os grandes livros? os da nossa vida?
É por isso que gosto de trocar ideias contigo, Nuno! Compreendo perfeitamente o que dizes. E sublinho a última parte ;)
Um abraço
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