sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Cão Como Nós - Manuel Alegre

Ler a prosa de Manuel Alegre é sentir o prazer da poesia sem ler poesia.
Kurika é um cão rebelde; faz tudo ao contrário, não responde à voz nem lambe as mãos. Um cão contestatário.
Um cão como nós, os que a todo o momento somos empurrados para as obrigações e a obediência. Mas, com o querer de quem luta, o cão ganha sempre.
Cão como nós, que finge e amua. Que mente descaradamente. Que é o que não é.
Cão como nós que nem da morte tem certezas; se tem/temos espírito; se o espírito nos tem a nós.
Cão como nós, prisioneiros dos sentimentos, carcereiros de emoções, cães que choram.
Cão como nós, cães que amam e se unem na angústia e no orgulho. Camarada cão. Melhor amigo do homem? Tretas! Camarada cão!
Cão como nós, a quem a tristeza se vê nos olhos, uma tristeza que não chega à palavra, apenas às falas da alma: o olhar, a poesia ou o silêncio.
Cão como nós que por uma vez se perde entre amores de verão, uma vez apenas, com tempo contado e previsto, sem eternidade, porque “não há outra eternidade senão a solidão partilhada”.
Cão como nós de quem até a morte parece ter medo, se bem que, no final da batalha, ela saia sempre vencedora.

12 comentários:

Teresa Diniz disse...

Gostei muito deste livro, que li já há alguns anos. Parece feito para mim, que amo livros e amo animais, particularmente cães e gatos.
Bjs

N. Martins disse...

Também o li, já há alguns anos. Embora não me lembre bem dele, não esqueci a ternura que senti nas palavras de Alegre. Lembro-me de achar o livro muito bonito e, eu não sou uma pessoa de animais, nem cães nem gatos... O último que li dele foi o Alma, também muito interessante, acho que meio autobiográfico.

Unknown disse...

Teresa e N. Martins, o que eu achei mais curioso é que me pareceu que Alegre coloca o acento tónico no homem que e não no cão. Nós somos como Kurika. Somos livres quando não obedecemos. Kurica desobedecia e triunfava sempre; era feliz.

Sofia disse...

Também já li há uns anos e emocionei-me! Obrigatório para quem, como eu, adora animais.

Poseidón disse...

OLa,

GOSTEI DE ISSO :

Cão como nós, prisioneiros dos sentimentos, carcereiros de emoções, cães que choram.

Saber comprender sus sentimientos y emociones es preciso.

um abraço e feliz fim de semana

Teresa Fidalgo disse...

Manuel,

Gostei imenso desse livro. Comecei a lê-lo e imediatamente o acabei. Depois, quase obriguei toda a gente que conheço a fazer o mesmo :)
Nunca tinha lido nada de Manuel Alegre, mas acho que comecei bem. Ele transporta, de facto, a poesia para a prosa, e torna-a muito bonita.
(talvez a partir daí tenha passado a merecer mais a minha admiração e por isso talvez hoje não tenha pejo em “apoiá-lo”… lol)

Unknown disse...

Teresa, indo directo ao assunto e sem medo de me acusarem de propaganda: que gosto eu teria se um poeta destes fosse Presidente da República!
Esta opinião que tenho não vem de agora; para mim, a Trova do Vento que Passa é um dos poemas mais belos e geniais da história da literatura portuguesa.
"Mesmo na noite mais triste
em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste
há sempre alguém que diz não."
Para que haja sempre alguém a dizer NÃO. Alguém que seja sempre cão como nós. ;)

Podeidón, obrigado pelas tuas palavras. Gracias :)

NLivros disse...

Viva Manuel.

Eu li esse livro há alguns anos e julgo que cheguei a escrever opinião.

Mas recordo-me que gostei da história e da escrita, embora confesse que nunca li mais nada de Manuel Alegre.

Teresa Fidalgo disse...

Manuel,

Fui um pouco imprecisa quando disse que nunca tinha lido nada de Manuel Alegre. Não é totalmente assim: Conhecia-lhe alguma poesia, não conhecia era a sua prosa…
E quanto à sua candidatura, pois bem, além de poeta, ele é um homem da liberdade… E de resto é como diz - um presidente poeta e com o nível cultural que tem, só nos ficava bem.

tsiwari disse...

Foi uma das ofertas da minha mãe, numa dessas alturas de ofertar - Natal, julgo.

Amei o livro que, tal como comentou a Teresa Fidalgo, li num ápice.

Parabéns pelo blog.

Anónimo disse...

Não sei se vou ler :(
Um abraço
Cristina

Anónimo disse...

EU GOSTARIA QUE O TEXTO TIVESSE MAIS DETALHES SOBRE O KURIKA PARA FAZER UM RETRATO POR ESCRITO DELE.