Quem se habituou a ler o que vou escrevendo, conhece o meu
desdém de estimação pelos críticos literários; a maioria deles exerce um papel
claramente antipedagógico sobre o ato de ler, preferindo a crítica negativa ao
incentivo à leitura e reservando os elogios para uma elite de escritores mais
ou menos obscuros.
No entanto, não há regra sem exceção. Alguns críticos
literários consideram este Alexandra Alpha um dos melhores livros do século XX.
Pois desta vez só posso concordar.
Esta é uma obra soberba; poucas vezes a ficção nacional terá
abordado de forma tão límpida este período fulcral da nossa história; refiro-me
à última fase da ditadura salazarista, a pseudo-primavera marcelista, o 25 de Abril
e o período pós-revolução.
Alexandra, publicitária, frequenta os meios intelectuais lisboetas mas a vida não lhe deixa muito tempo para combates políticos; Sophia Bonifrates artista experimental
de teatro de fantoches, mulher radical; Maria, professora e revolucionária que um dia dialogou
com o poeta Ruy Belo; Bernardo Bernardes, culto, homem das letras, intelectual;
Diogo Sena, fotógrafo que um dia caiu no conto do vigário à conta de um
cineasta de vanguarda; Sebastião Opus Night, bêbado e fascista por pouca
convicção são alguns dos jovens dos anos sessenta que enfrentarão a revolução
cada um a seu modo; uns acomodar-se-ão de forma mais ou menos cobarde; outros
terão em Abril o dia dos seus sonhos; outros perder-se-ão num espírito revolucionário
que se misturou com oportunismo e cegueira radical.
A ditadura, a censura e a guerra colonial eram um inferno;
mas o paraíso cantado pela genial prosa poética de Cardos Pires dará lugar à
confusão de um período pós-revolucionário onde as boas vontades não foram
suficientes para fazer de Portugal um país próspero e justo.
Numa análise descomprometida e artística, recorrendo a um
humor refinado e um espírito crítico apurado, o nosso enorme escritor oferece-nos
nesta obra uma visão clara, numa escrita agradável, um retrato colorido deste período
fulcral da nossa história.
Mais do que artística, a escrita de Cardoso Pires tem aquele
perfume de veracidade, realidade que nos faz reviver o passado sem esforço, sem
intelectualismos inúteis e, acima de tudo, sem comprometimentos políticos.
Uma obra para ler e reler.
3 comentários:
Um dos meus autores favoritos. O Delfim Continua a ser o seu LIVRo, mas Alexandra Alpha não decepciona. Boa critica, gostei bastante do seu ponto de vista acerca do livro.
Sérgio M. Fernandes
Tenho o livro e nunca o li. Fica para uma leitura em breve, já que os próximos já estão definidos! Obrigada pela opinião. Que é idêntica à minha em relação aos ditos críticos literários... :)
Beijocas
Olá Sérgio
também gostei muito do Delfim. Li-o há tantos anos que vou ter de o reler.
Teté, se todos tivessemos uma postura como a deles já não havia leitores em Portugal. Eu só não consigo entender é como eles encaram isso...
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