Sinopse:
Uma Ilha selvagem no Sul do Alasca, a que só se consegue chegar de barco
ou de hidroavião, repleta de florestas virgens e montanhas escarpadas.
Este é o cenário inóspito que Jim escolhe para fortalecer a relação com o
seu filho Roy, que mal conhece. Doze meses pela frente, numa cabana
isolada do resto do mundo. Mas as difíceis condições de sobrevivência e a
tensão emocional a que se vêem sujeitos rapidamente transformam esta
viagem num pesadelo, tornando a situação incontrolável.
Comentário:
Soube pela revista Ípsilon, do jornal Público, que o pai do
autor cometera suicídio quando ele tinha 13 anos, e apenas duas semanas depois
de ter recusado passar algum tempo com ele numa ilha no Alasca. Este facto
ilumina-nos um pouco quanto ao tom negro com que o livro foi escrito: uma
aventura no Alasca em que pai e filho acabam por se envolver numa enorme
tragédia.
Este livro foi escrito antes daquele que comentei
anteriormente (A Ilha de Caribou) e o enredo tem a particularidade de se passar
num tempo cronológico posterior. Ou seja, o segundo livro do autor passa-se
antes do primeiro, numa espécie de analepse. Trata-se de um livro nitidamente
escrito com sangue. Ou, no mínimo, com uma dor latente que fornece à escrita
este tom pungente, triste, cinzento mas por vezes desesperado. A aridez da
paisagem, a solidão que invade todas as frases do livro, o drama de um pai
incapaz de comunicar com o filho, o desespero de um filho arrastado para uma
desgraça anunciada, tudo isto faz deste livro uma obra dolorida, dramática,
triste e de uma beleza quase gótica. O drama humano do confronto de duas
solidões (a do pai desiludido pela vida e a do filho proibido de sonhar)
transmite-se ao leitor, contagiando-o em toda esta visão negra do mundo e da
alma.
David Vann revela uma mestria invejável no domínio da
escrita. Num estilo claro, objetivo, obriga o leitor a deixar-se contagiar pela
dimensão dramática da obra.
Se, por um lado, são nítidas as marcas pessoais do autor, a
sua história de vida, também fica clara a sua paixão pro aquela terra inóspita,
o Alasca, que convida a uma vida interior intensa. Os personagens de Vann não
têm amigos; são, eles próprios, mundos inteiros de conflitos interiores, de
dramas intensos, de incertezas, medos e atos de loucura. Há neste livro uma
estranha paixão pela terra gelada que é, ao mesmo tempo, uma estranha paixão
pela solidão, pelo silêncio e até pelo desespero.
Em suma, podemos afirmar que David Vann escreve com alma,
mas mais que isso: escreve com sangue e dor.
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