Sinopse:
Livro recomendado pelo Plano Nacional de Leitura 3º Ciclo -
Leitura Autónoma Centro Novas Oportunidades - Leitura Autónoma - Grau de
dificuldade II História fantástica que recorre ao imaginário mágico, por vezes
de inspiração surrealista, este romance é um prodígio de efabulação e engenho
narrativo.
Comentário:
Sob a aparência de um (falso) conto infantil esconde-se uma belíssima e
divertida obra de arte. Este está longe de ser um livro para crianças. O livro
foi escrito na fase emergente da ditadura fascista (1933), quando foi publicado
sob a forma de folhetim e, depois, com alterações em pleno período negro e
decadente do salazarismo, em 1963. Neste contexto, a sua aparência de ingénuo
conto infantil terá enganado certamente a censura do regime.
Mas talvez a intenção inicial de José Gomes Ferreira não
tenha sido a mensagem política; antes qualquer leitura ideológica, é necessário
afirmar que a ideia fundamental é a da inversão da lógica do conto maravilhoso:
em vez de prosseguir o cominho da felicidade, o nosso herói envereda pelo
caminho mais difícil, pelo caminho pedregoso, onde até as pedras mordiam os pés
do viajante. Pelo contrário, quem seguia o caminho da felicidade, teria de
ficar sem cabeça. Talvez seja esta a primeira leitura política da obra; aqueles
que apoiaram a ditadura terão sido iludidos por um caminho de felicidade, tendo
para isso prescindido da racionalidade.
Ao longo da obra, em vez de palácios encantados e fadas
madrinhas, João Sem Medo enfrenta monstros, bruxas e feiticeiras malévolas e
toda a sorte de obstáculos; tudo era infelicidade e desventura. No entanto, o
medo só por uma vez o assaltou. E nessa altura dá-se o momento mais divertido
do livro: João, em desespero, apela para a única pessoa que o podia salvar:
José Gomes Ferreira.
Ao longo destas desventuras, são bem visíveis as alusões ao
regime fascista: personagens que se vangloriam de serem os salvadores, os
redentores e outros que se destacam pelos belos discursos mas sem nunca construírem
nada que pudesse contribuir para a felicidade dos habitantes da floresta. No
final, como no início, fica a mensagem positiva, a contrastar com a realidade
da floresta amaldiçoada: há sempre uma esperança que nunca morre, desde que o
medo não morra; a esperança que João viveu logo no início, quando salta o muro
que o fez sair da sua aldeia de chorões e a esperança final, quando regressa
aos braços de sua mãe…
Num tempo em que a literatura fantástica tem adquirido
tantos adeptos seria bom que os leitores portugueses, principalmente os mais
jovens, ganhassem coragem para ler este livrinho. E, já agora, que os editores
pensassem um pouco mais na literatura portuguesa e na sua promoção. José Gomes
Ferreira é, também, um escritor fantástico. Literalmente e não só…
8 comentários:
Este é um dos que está no meu top 50. Quando o descobri em 2010 fiquei maravilhada com a sua capacidade efabulatória de JGF!
Sim devia-se promover mais os livros de escritores portugueses ligados ao fantástico. Estou a lembrar-me agora do livro de "O Fabuloso Teatro do Gigante" de David Machado ou até "O Evangelho do Enforcado" de David Machado, que entram bem nessa etiqueta.
Não conheço o livro, mas depois de ler o seu comentário, deixou-me curiosa. Ficou na lista do to-read, tal como vários outros promovidos no seu blogue. Obrigada por isso!
E parabéns pelo sucesso!
Por gostar tanto, aproveito para lhe fazer um convite: visite o nosso projecto em www.theperks0fbeingalibrarian.blogspot.com e dê-nos a honra de receber um comentário seu :P
Ficaremos à espera :)
Beijinho
Tonsdeazul
como sabes, sou um principiante no fantástico. Por isso não comeces já a tentar-me com David Machado ou esses góticos que por aí andam :):):)
The Perks of Being a Librarian
O que espanta é o facto de, tradicionalmente, este escritor ser considerado um neo-realista :)
Enganei-me no nome do autor, Manuel. Queria dizer David Soares e olha que o seu livro "O Evangelho do Enforcado" é muito bom. Já para não falar de "A Conspiração dos Antepassados", em que tem Fernando Pessoa como um dos personagens principais. ;)
Boas leituras!
:) Pois, é uma mistura de Dinis Machado com David Soares. Nunca os li mas hei-de ler :)
Conheço este livro desde do sétimo ano quando tive uma professora de Português que o introduziu no programa em vez d' Os Bichos de Miguel Torga. Na altura fiquei deveras fascinado com a história é posteriormente, sabendo a metáfora que nele encerrava ainda mais me despertou a curiosidade. Desde daí já por diversas vezes o reli e está sempre na minha estante. Claro que também li posteriormente, Os Bichos e Contos da Montanha duas grandes obras do mestre. Obrigado por falar de forma tão eloquente de um livro que talvez seja aquele que me mostrou o que é ser um homem de verdade.
Conheço este livro desde do sétimo ano quando tive uma professora de Português que o introduziu no programa em vez d' Os Bichos de Miguel Torga. Na altura fiquei deveras fascinado com a história é posteriormente, sabendo a metáfora que nele encerrava ainda mais me despertou a curiosidade. Desde daí já por diversas vezes o reli e está sempre na minha estante. Claro que também li posteriormente, Os Bichos e Contos da Montanha duas grandes obras do mestre. Obrigado por falar de forma tão eloquente de um livro que talvez seja aquele que me mostrou o que é ser um homem de verdade.
Crazyflash, é bom saber que há livros que marcam mesmo a nossa vida!
abraço
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