Sinopse:
Andará de casa em casa, de hotel em hotel, mudará o nome,
mudará o rosto, deixará crescer o bigode, usará óculos sem lentes, um
passaporte para os hotéis, outro para viajar, em cada novo documento um nome e
uma profissão diferente, está clandestino dentro de si mesmo, perdeu os sítios,
as referências, a identidade.
É ele e já não é, não usa o nome próprio, tem quatro ou cinco pseudónimos que são um ou outros, heterónimos do desaparecido que traz dentro de si, ora é francês, ora espanhol, ora argelino, ele é sozinho, não propriamente, como queria o outro, uma literatura, mas uma nova brigada internacional.
É ele e já não é, não usa o nome próprio, tem quatro ou cinco pseudónimos que são um ou outros, heterónimos do desaparecido que traz dentro de si, ora é francês, ora espanhol, ora argelino, ele é sozinho, não propriamente, como queria o outro, uma literatura, mas uma nova brigada internacional.
Comentário:
Rafael é, em grande parte, um livro autobiográfico. Nele
Manuel Alegre exprime grande parte das angústias e dificuldades de um exilado
no tempo do Estado Novo, como foi Rafael e como foi Manuel Alegre.
O exilado é aquele que escolheu uma das formas de luta mais difíceis
que se pode imaginar, porque ele contará sempre com mais um adversário: ele
próprio, a sua consciencia, o seu sentido do dever, a utilidade da sua luta, o significado das ideias que defende. E, acima de tudo, a certeza de um ideal que nem semrpe é inabalável. Tudo isto, por vezes, agravado pelo drama da queda dos ideais, como aconteceu com o desmascarar do Estalinismo em plena época de esperança.
Muitas vezes é apontado a Manuel Alegre o facto de nunca ter
lutado na guerra colonial e ter optado pelo exílio em vez da luta no terreno,
como fizeram outros heróis da resistência, como Álvaro Cunhal. No entanto,
neste livro como em muitos outros testemunhos, Alegre mostra-nos como é
fundamental o papel do exilado, o homem que vive e sofre longe daqueles que ama
mas também longe daqueles que gostava de enfrentar.
Mas mais do que isso, mais do que qualquer leitura política,
este livro é um testemunho poderoso da luta de um homem contra a sua própria
solidão e contra o seu próprio destino. É um livro terrivelmente bem, escrito.
Poucos em Portugal escrevem como Manuel Alegre: trazendo para a prosa toda a
musicalidade da poesia, com frase diretas, simples mas de uma grande beleza.
Por outro lado, o encanto da escrita de Alegre deve-se também ao assumir da
subjetividade, a esse escrever com sentimento, com Alma, como pouco conseguem.
Finalmente, um aspeto que me agrada sobremaneira nestes
grandes escritores da “velha guarda" da literatura portuguesa como Manuel Alegre ou
Mário de Carvalho, é não caírem no pessimismo nem se refugiarem em tons de
cinzento ou de negro, como forma de tornar as suas mensagens mais atrativas.
Infelizmente, parece ser uma tendência dos jovens sucessos literários
esconderem-se no dramatismo de faca e alguidar. Não é isso que faz Manuel
Alegre; a sua escrita, sentida, límpida e objetiva não cai nunca no dramalhão
nem no catastrofismo.
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