sexta-feira, 22 de agosto de 2014

A Leste do Paraíso - John Steinbeck

Comentário:
Escusado será de dizer que estamos perante um livro notável. Normalmente atribuo uma avaliação de zero a dez a todos os livros que leio. Até hoje só tinha atribuído a nota máxima a nove livros. Este é o décimo e Steinbek é o único escritor com dois livros nesta lista.
Publicado em 1952, nos alvores da Guerra Fria, este livro transporta consigo uma força tremenda. E essa força deteta-se, desde logo, num título belíssimo e também premonitório: a associação de ideias entre o Leste e o Mal será, ao longo da segunda metade do século XX, uma realidade incontornável (o lado Leste do Paraíso é o sítio para onde se deslocou Caim após ter matado Abel).
Uma das maiores virtudes deste escritor genial é a forma como gere a narração e o desenrolar do enredo, com uma economia narrativa notável: sem excessos de adjetivação nem de descrições, mas também sem lacunas; tudo nos é narrado  de uma forma objectiva, clara.
Quanto à temática do livro, ele tem de se entender na sequência dessa outra grande obra-prima do autor, As Vinhas da Ira (1939); tal como nesse outro grande livro, interessa mais a Steinbeck a compreensão e explicação do espírito humano do que os factos em si.
Outra marca distintiva deste génio é a força dos seus personagens. Em As Vinhas da Ira, Tom Joad e a mãe são os exemplos mais marcantes de força de caráter e bondade humana. Em A Leste do Paraíso, a bondade de alguns personagens aparece-nos em contraponto com uma espécie de maldade natural, mais evidente em Cathy mas também nos personagens Charles e Cal, claramente inspirados no personagem bíblico Caim. Aliás são inúmeras e muito significativas as referencia bíblicas nesta obra. Cathy representa a maldade mais requintada, como se alguns seres humanos nascessem como aberrações, como autênticos monstros. No entanto, em todos os personagens a quem é atribuída essa maldade natural, ela vem enquadrada numa certa lógica, como se o mal fosse inerente ao ser humano. No fundo, o confronto entre o Bem e o Mal constitui o verdadeiro âmago deste livro, como explicarei adiante.
A opção por personagens muito fortes não acontece por acaso; ela deriva da crença de Steinbeck na força do espírito humano; não na força do espírito coletivo, mas na força do ser individual: só individualmente o ser humano é capaz de criar, como o próprio autor explica no início do segundo capítulo.
Tal como em As Vinhas da Ira, também aqui é notável a relação do homem com a terra, como se esta fosse uma extensão do ser humano. No entanto, a Terra é fonte de alimento mas também de sofrimento; a alegria e o prazer parece só ganharem significado em confronto com o sofrimento, da mesma forma que o Bem só ganha sentido em paralelo com o Mal.
Esse confronto é analisado, ao longo de todo o enredo, em confronto com a própria Bíblia. O livro sagrado parece ser encarado como uma espécie de sentença de condenação perpétua que paira sobre o ser humano. Mas, pelo contrário, a religiosidade da personagem Lizzi é enternecedora. A ela só não agrada a ideia de no Paraíso não se trabalhar; por isso ela planeia realizar lá uns serviços, quando morrer,como remendar nuvens ou limpar as túnicas dos santos. Estas personagens positivas, como Lizzi ou Samuel são o contraponto da maldade extrema de Cathy mas também de uma espécie de maldade natural, humana, de Cal ou Charles, os herdeiros de Caim. O mais terrível é que esta luta está dentro de todos os seres humanos; todos nós temos no nosso espírito algo de Caim e de Abel. E essa luta prevalece até à morte, como acontece com Adam...
Lee, o criado chinês paira sobre o enredo como se fosse um elemento exterior ao livro: fruto de uma formação oriental, ele não foi contagiado pela bíblia; por isso ele detém a sabedoria e a racionalidade. É ele quem faz esta afirmação absolutamente notável:
"Fumo os meus dois cachimbos todas as tardes, como fazem os mais velhos, e sinto que sou um homem, e o homem é uma coisa muito importante, talvez mais importante ainda do que uma estrela. Isto não é teologia. Não dobrei a espinha perante os Deuses mas surgiu em mim um novo amor por esse instrumento brilhante que é a alma humana. É uma coisa maravilhosa e  única no mundo. Está sempre a  ser atacada e nunca é destruída porque TU PODES."

Sinopse:
Com acento bíblico, o grande autor de As Vinhas da Ira define o universo de A Leste do Paraíso através das seguintes inspiradas palavras: «O assunto é o mesmo que cada homem tem utilizado como tema: a existência, o equilibro, a batalha e a vitória, na eterna guerra entre a sabedoria e a ignorância, a luz e a treva, o bem e o mal.» A Leste do Paraíso, vasto fresco levantado a partir do relato da vida de várias gerações de duas famílias norte-americanas, os Trask e os Hamilton, num período crucial da história dos Estados Unidos (1860, Guerra da Secessão – 1920, anos imediatos à Primeira Grande Guerra), proporcionou ao malogrado James Dean talvez o mais importante papel da sua carreira.
in www.fnac.pt


7 comentários:

JMend disse...

Muito bom, parabéns, gosto muito do seu blog.

Unknown disse...

Obrigado, Job. Abraço e volte sempre

Teté disse...

Li há muitos anos e gostei muito. Tenho é de ler o outro de Steinbeck, que dizem ser a sua obra-prima!

Beijocas e continuação de boas leituras!

Unknown disse...

Olá teté. referes-te às Vinhas da Ira. Aconselho-te também o filme. Um GRANDE FILME de John Ford com Henry Fonda em início de carreira

N. Martins disse...

E agora voltou a vontade de o reler pela... 4ª vez. :) Adoro, adoro e adoro Steinbeck!
Boa "opinião", mais uma vez. :)

Unknown disse...

Olá N.
É um livro enorme, tal como As Vinhas da Ira mas lê-se com uma rapidez espantosa, porque agarra o leitor:) Tenho urgentemente de reler As Vinhas

Pedrita disse...

eu adorei esse livro. aqui no brasil tem o nome de a leste do éden. beijos, pedrita