sexta-feira, 11 de junho de 2010

O Rapaz do Pijama às Riscas - John Boyne


Nunca ninguém me há-de convencer que se fala demasiado do Holocausto Nazi. Relembrar estas situações, em que a maldade humana foi levada um extremo inimaginável, será sempre, a meu ver, uma necessidade. Para que a memória ainda possa evitar que a loucura de alguns seres humanos atinja estas proporções...
A insanidade nazi provocou situações que, sem dúvida, serão sempre terreno fértil para escritores e cineastas. Infelizmente, na maior parte dos casos encaminhou-se esta base histórica para a exploração fácil da violência nos ecrans e até nos livros. Mas não tem de ser assim. Recentemente, O Leitor foi um exemplo magnífico de como ainda é possível fazer leituras profundamente humanas e ver perspectivas novas no contexto do Holocausto. E este é mais um exemplo.

O que este livro tem de mais interessante é, na minha opinião, o de nos mostrar o lado dos alemães na guerra. O nosso herói, Bruno, de nove anos, é filho do comandante de Auschwitz (Acho-Vil no dizer ingénuo da criança). O pai é um dos favoritos de Hitler, o Fuher (O Fúria para Bruno) e tenta esconder do jovem tudo o que se está a passar relativamente ao extermínio dos judeus. Assim, é por si próprio, nas suas explorações infantis, nas suas brincadeiras ingénuas que Bruno se vai aproximando da terrível verdade que o rodeia.
Shamuel nada sabe porque nada lhe dizem, mas quem será realmente ignorante? A criança a quem nada se diz ou todos aqueles que julgam ser detentores das verdades absolutas e nada sabem dos outros, dos que consideram inferiores? A pior ignorância não será a que vem disfarçada de verdades inabaláveis?
No campo da morte, junto à vedação que ele conhece pelo lado de fora, é Shamuel, o amigo do pijama às riscas que o vai acompanhar nessa horrível descoberta. Mas os dois meninos vivem mundos diametralmente opostos. No entanto, algo de monstruoso os irá encaminhar para um destino comum.
Bruno é a criança inocente que, como tantas outras, é vista pelos adultos como um ser menor. E quantos de nós, adultos não caímos tantas vezes neste mesmo erro, de considerar a criança como um ser inferior, que não precisa de saber a verdade das coisas, de quem se pode esconder tudo?! Tanta ingenuidade, a nossa. A criança não é um adulto incompleto; e que bom seria se nós próprios conseguíssemos apreender de vez esta ideia.
Junto à vedação, Bruno inveja Shamuel porque embora enclausurado, tem muitos amigos. Bruno, o menino rico, protegido e a quem nada falta é o menino infeliz e solitário. Mais um “recado” para nós: o que damos nós às nossas crianças? Dinheiro e mentiras?
Gostava ainda de chamar a atenção para o final do livro. Considero-o absolutamente genial. Genial na forma como é construído, com um contexto de suspense que prende o leitor até ao fim mas também com uma carga simbólica extraordinária. Um final dramático e belo ao mesmo tempo. Porque na mais profunda tristeza também há beleza.
Um livro genial. A par de O Leitor, trata-se de um dos melhores romances escritos nos últimos anos sobre este tema (infelizmente) sempre actual. 

10 comentários:

Paula disse...

Fiz esta leitura o ano passado e achei o livro extraordinário.
A ingenuidade das crianças é explorada ao máximo. Nunca uma crianças pensaria em tal barbaridade. Não há dúvida que até sermos corrompidos pela sociedade somos puros.
Os adultos, estes tudo banalizam, substimam, estragam. "Estragam" até o que lhes é mais precioso - os filhos.

susemad disse...

Não cheguei a ler este livro, mas vi a adaptação para cinema e foi um filme, que a par de "O Leitor", me impressionou bastante. Principalmente o seu desfecho.
Parte dos meus livros são sobre o Holocausto e por mais livros que leia sobre este tema sei que nunca me irei de cansar de os ler. Como bem referes, relembrar é uma necessidade para jamais ficar esquecido.
Dois livros que gosto bastante e que considero diferentes de tudo o que já li são "Sem Destino", de Imre Kertész e a colectânea "Maus I" e "Maus II", de Art Spiegelman. Estes dois últimos são de BD. Disseste-me que só costumas ler os clássicos da Disney, mas acredita que estes valem bem a pena! Para mim são uma preciosidade. Retratam de uma forma bastante perfeita todo o horror vivido na ocupação Nazi.

Livros e Outras Coisas disse...

É como diz o Manuel, esta obra dá-nos uma perspectiva do outro lado da vedação, o olhar de uma criança e tudo se torna mais subversivo ainda, dando consistência ao final.
Antes do livro, também vi a adaptação ao cinema. Vimo-la ainda numa aula e a consternação era geral.

Unknown disse...

Olá Paula
é por isso que a vida é uma luta diária. Quando deparamos com as grandes asneiras da humanidade temos tendência a pensar "isto hoje seria impensável". Mas todos os dias fazemos pequenas asneiras...
tonsdeazul´
nunca tinha ouvido falar dessas obras. Prometo que me vou informar.
Livros e Outras Coisas: neste ano levei para as aulas o "A vida é Bela". Houve choradeira, como é normal e saudável. Agora tenho de ver estes filmes - o Leitor e este.
Abraços para vocês

Luciano Azevedo disse...

Assisti primeiro ao filme e depois li o livro. Sou "fascinado" pela temática que o autor do livro aborda. E a temática me fascina porque faz pensar sobre a medida da maldade humana e, a um tempo, faz refletir sobre as atitudes que devo assumir para que a bondade e a compaixão acompanhem meus dias. Grande livro!

Unknown disse...

Luciano
"COMPAIXÂO". Eis uma palavra-chave tão desprezada hoje em dia.
Não há holocausto, hoje, dizem mitos. mas há, digo eu. Por esse mundo fora há múltiplos holocaustos e até os que foram vítimas outrora colaboram hoje noutras catástrofes.
Compaixão é o sentimento que se impõe. Cada vez mais. Ou solidariedade.
Um abraço

Unknown disse...

onde escrevi "mitos" queria dizer "muitos"
Abraço

Lia Silva disse...

Adorei a tua critica! E concordo contigo em tudo. Estes temas são dos que mais me fascinam, infelizmente pelas piores razões mas é bom que chamem a atenção. É com conhecimentos destes que as piores facetas dos seres humanas se revelam e criamos um espírito de injustiça que nos faz melhorar enquanto pessoas.

Tens um jogo à tua espera no meu blog.. Beijos

Teresa Diniz disse...

Este livro foi uma das minhas descobertas do ano passado e li-o, depois, com os meus alunos, já que a perspectiva de uma criança os toca de outra maneira.
Tens razão: o Holocausto deve ser estudado e recordado como o paradigma da indiferença humana perante o Outro. Infelizmente, hoje, há muita gente que deixa contagiar o Holocausto pela antipatia por Israel e tende a branqueá-lo. Não podemos permitir.
Bjs

Unknown disse...

Sem dúvida, Teresa.
Neste ano explorei o "A Vida é Bela". Adoraram. Mas tenho de ver este e o Leitor.