sexta-feira, 6 de agosto de 2010

O Outono do Patriarca - Gabriel Garcia Márquez

O genial escritor colombiano afirmou um dia que este livro era uma transgressão total da gramática. Com claras influências (a meu ver) de William Faulkner, Marquez assume um estilo absolutamente inovador para a época, não usando parágrafos e multiplicando os narradores, o que dá à leitura um ritmo alucinante, quase impedindo o leitor de pausar a leitura.
Trata-se de uma obra marcante na literatura sul americana: um ditador, general sem nome, algures nas Caraíbas governa mergulhado na ignorância, cultivando o obscurantismo. É, obviamente, uma caricatura, mas estão ali todos os sinais marcantes dos modernos e antigos déspotas.
Ler este livro é como caminhar numa paisagem fantástica, imaginária mas que a todo o momento nos evoca situações bem reais, sinais de um mundo louco dirigido por generais caducos e dementes; um mundo real como este em que vivemos.
Imagine-se um palácio de governo herdeiro do passado colonial algures nas Caraíbas. As vacas e as galinhas, que o general presidente alimenta e cuida como se esse fosse o mais nobre dos seus deveres, povoam o palácio, distribuindo pelos aposentos os seus sagrados dejectos e assomando mesmo às janelas e varandas. A bosta de vaca seca é usada pelo general para fazer fogueiras que aquecem o palácio.
O general presidente canonizou a mãe por decreto; só a morte da mãe lhe amoleceu o coração.
Morreu algures entre os 107 e os 232 anos (nunca se soube ao certo). Teve uma terceira dentição, calcula-se que por volta dos 150 anos de idade.
Vendeu o mar aos americanos que o levaram para o Arizona.
Teve mais de 500 filhos, todos nascidos aos sete meses de gestação. A um deles nomeou-o general ao nascer.
A mãe afirmou um dia sobre ele: “se soubesse que o meu filho vinha a ser Presidente da República, tinha-o mandado à escola.”
O general presidente não pode ser coração mole. Ele tem de se manter acima de todos os mortais, seguindo à risca o conselho que alguém lhe dera em jovem: “o coração é o terceiro colhão”.
Embora usufrua de centenas de concubinas, que possui sempre sem tirar as botas nem a roupa, só uma paixão o dominou: Manuela Sanchez.
Nunca precisou de ministros para a governação, com excepção do Ministro da Saúde, seu médico pessoal. Mas nem mesmo este alguma vez o conseguiu curar de um terrível e descomunal testículo herniado. Mandou assar o Ministro da Defesa, seu homem de confiança nos primeiros tempos de governação, servindo-o com um raminho de salsa na boca num jantar de cerimónia.
Em suma: um livro cheio de humor, um marco histórico na literatura mundial. 

11 comentários:

Anónimo disse...

Livro maravilhoso!!!!!!!!!!!!!
Sou devota de Gabriel Garcia Márques.
Bjs.

susemad disse...

Engraçado... Ontem terminei de ler "Os Dois Irmãos", de Germano Almeida e quando me dirigi para a minha estante de livros não lidos a minha mão inclinou-se para este de Garcia Márquez, mas depois avistei «O Vermelho e o Negro», de Stendhal e foi esse que tirei. ;)
Se até lá não mudar de ideias, pego então n'"O Outono do Patriarca", pois confesso que já tenho falta de ler este autor!

N. Martins disse...

Esse ainda não li. Quem sabe não será o próximo, já não leio Garcia Marquez há muito tempo.

NLivros disse...

Já li muitos livros de Garcia Marquez, tenho esse mas, confesso, que nunca o li, pese embora não desconfie minimamente da sua qualidade.

Aliás, conheço uma pessoa que adora Garcia Marquez e que considera o "Outono do Patriarca" um dos melhores 3 livros dele.

Unknown disse...

tons de azul, não há coincidências :) se a tua mão se inclinou para aí, tens de ler :)
A sério, sei que vais gostar.
Fátima, estás aí bem no meio da América Latina, acho que entendes bem como a caricatura do ditador faz sentido. Vocês, no Brasil até têm tido sorte no meio de tantas ditaduras... Eu também adoro Garcia MArquez.
N. Martins, o que eu acho fantástico é que Garcia MArquez tem muitos livros geniais mas há 3 que eu destaco e que são COMPLETAMENTE DIFERENTES uns dos outros: este, o Cem anos de Solidão e o Amor em Tempos de Cólera. 3 obras fantásticas que só um génio podia escrever de 3 maneiras tão diferentes.
Iceman, adorava que me soubesses responder a esta pergunta: essa pessoa não terá como os 3 melhores precisamente os 3 que eu indiquei acima?

A todos os que gostam deste autor eu aconselho a sua autobiografia: Viver para Contá-la. É fantástica!

NLivros disse...

Precisamente esses três.

:)

NLivros disse...

Viver para Contá-la já li e é de facto fantástico.

Mas não era suposto ser a primeira parte da sua autobiografia? Ele não ficou de escrever a continuação?

susemad disse...

Como não li este ainda não posso dizer muito, apesar de acreditar que vá gostar. Mas para além desses outros dois que mencionas, Manuel também gosto muito da obra "Ninguém Escreve ao Coronel", que foi o primeiro que li do autor e considerei uma pequena maravilha.
E não, não há coincidências! ;)

Unknown disse...

Creio que sim, Iceman.
Acontece que ele está gravemente doente, já há bastante tempo, com cancro. Li há dias que está a fazer tratamentos em Cuba. Espero que ainda consiga terminar a auto-biografia... e não só.

Unknown disse...

Tens razão, tonsdeazul. Ninguém Escreve ao Coronel é um grande livro. Também o li quando ainda era estudante (após a extinção dos dinossauros, acho) :) Tenho de o reler.

Zenilton disse...

"A Incrível e Triste História da Cândida Eréndira e da sua Avó Desalmada" foi, aos 13 anos, a minha estreia no mundo dos livros.
Não se esqueçam de "Crônicas de uma Morte Anunciada", que tem um enredo espetacular. Talvez por ter sido um veradeiro colega da adolescência, considero este o seu livro nº 1.
Zenilton.