Numa obra muito menos ambiciosa do que a obra-prima “As Vinhas da Ira”, John Steinbeck conta-nos a história de George e Lennie, dois homens que percorrem as grandes propriedades agrícolas à procura de cumprir um sonho: juntar dinheiro para um pequeno pedaço de terra onde possam criar coelhos. Ou melhor, onde possam ser livres e trabalhar para eles próprios. George é inteligente e corajoso. Lennie é forte como um touro mas é, na perspectiva do comum dos mortais, um idiota.
Mas a extrema sensibilidade de Steinbeck mostra-nos um Lennie profundamente sensível, uma espécie de criança grande, sujeita a todas as ameaças que a sociedade expõe às almas simples. Esta alma simples, no entanto, é vítima da sua força bruta. O que prevalecerá? O seu coração de criança ou a sua força ameaçadora para aqueles que existem para dominar os outros?
Lennie, na sua inocência, é uma criança. Mas para os poderosos ele é uma ameaça. Um alvo a abater pela sociedade.
À volta de George, outros sonhadores surgem. Mas todos eles encontrarão o desencanto da realidade. Não obstante, como diz o poeta, a primavera é inexorável.
O sonho de George, também ele, será espezinhado. Não morrerá porque ser eterno é apanágio dos sonhos. Fica o sofrimento: a vida dos que percorrem o mundo à procura de uma sobrevivência que só pode ser adornada pelo sonho; a vida de quem só nos sonhos pode ser livre.
Tal como As Vinhas da Ira, este é um livro sobre os limites do sofrimento humano mas também sobre os sonhos que, esses, não conhecem limites. Mas é também uma crónica sombria da maldade e do egoísmo humano; a crónica de um caminho a que alguns chamam “espírito capitalista”. E a que outros chamam exploração do homem pelo homem. Infelizmente, esta é uma mensagem actual.
É um livro pequenino, que se lê com prazer mau grado o sofrimento que nos invade a alma.
Avaliação pessoal: 8/10
2 comentários:
Sou suspeito em relação ao Steinbeck. Se me perguntarem qual o melhor escritor do século XX - pergunta que finjo detestar, talvez porque me deixa sempre tão hesitante -, responderei, conforme a disposição e a época do ano: o Gabriel Garcia Márquez, o Saramago, O Somerset Maugham, o Steinbeck. Dos norte-americanos o Steinbeck é a minha referência, juntamente com o Erskine Caldwell, autor que muito me marcou (um Manuel da Fonseca "amaricano"). E das suas obras adoo este Ratos e Homens, aliás bem passado para o cinema, com o grande Malkovich como seria de esperar. Um livro obrigatório.
Olá Fernando. Eu também sou suspeito :) Considero As Vinhas da Ira um dos melhores livros de sempre. Aquilo marcou-me mesmo. E o filme do John Ford já um vi dezenas de vezes porque costumo mostrá-lo nas aulas do nono ano. Eles torcem o nariz quando vêem que o filme é a preto e branco e tão antigo mas depois adoram.
O melhor livro de sempre, para mim é o D. Quixote. O melhor escritor, estou como tu, é conforme a maré. Mas Steinbek anda de braço dado com Tolstoi, Cervantes, Dostoievski, Faulkner...
Eu não vou à bola com os "américas" mas nisto da escrita abro excepção, com os seus 4 ases: Steinbeck, Faulkner, Roth e Auster.
Não conhecia esse filme... vou procurar até porque também admiro imenso o Malkovich. Fabuloso em Ligações Perigosas...
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