Que dizer de um dos maiores clássicos da literatura brasileira?
Como ponto de partida, fica o lugar-comum: é uma obra prima!
O aspecto que mais me deliciou ao longo da leitura foi a clareza da linguagem; a forma objectiva, límpida, simples e directa com que Assis nos conta uma bela história de amor e de vida. Nada é supérfluo na narração; não há descrições desnecessárias; e a forma bem disposta como o autor se dirige ao leitor na segunda pessoa do singular – um tratamento por “tu” que nem é comum na expressão brasileira da língua portuguesa. Esta familiaridade com o leitor reforça a feição lúdica da leitura, criando uma notável empatia.
Ao nível do conteúdo, D. Casmurro perpassa todas as grandes angústias que povoam a existência humana: o ciúme, a morte, o adultério, a descrença, fazendo com que amiúde o leitor seja levado a olhar para a sua própria vida, de tal forma estes problemas são materializados em situações comuns.
A história de Bento Santiago é contada na primeira pessoa, desde tenra idade até ao presente do narrador. Bento é um rapaz muito inteligente de uma família aristocrática brasileira em meados do século XIX. Orfão de pai, é destinado pela mãe, em função de uma promessa, ao seminário. Nesta situação desenrola-se o primeiro grande dilema de Bento: como conciliar este destino com o amor ingénuo mas profundo por Capitu. Depois vem a amizade pelo colega de seminário, Escobar que o acompanhará até à tragédia. Mais tarde será o ciúme a atormentar a vida de Bento. E, finalmente, os dramas da morte. E fica a ideia de como o ser humano é capaz de destruir a felicidade ao mesmo tempo que a procura desesperadamente.
Mau grado o dramatismo extremo de algumas situações a leitura mantém-se agradável até ao fim. Dificilmente alguém abandona este livro a meio.
Um dos aspectos mais notáveis deste livro é o retrato social da época; de um Brasil ainda imperial, ainda esclavagista e ainda profundamente marcado por uma religiosidade conservadora e por valores morais muito rígidos. É a este mundo fechado e difícil que Bento sobreviverá, primeiro com todas as belezas de um amor feliz, depois com todo o drama que a existência humana é capaz de enfrentar.
Avaliação Pessoal: 9/10
2 comentários:
Um dos melhores de Machado. Um livro recente, do qual falo no meu blog, de Marco Lucchesi - O Dom do Crime - fala de um caso verídico, ocorrido no Rio, e que teria influenciado o autor na construção de Dom Casmurro. Machado era repórter nesta época. Vale conferir.
Concordo plenamente com a sua opinião Manuel. É esse "tu-cá-tu-lá" que Machado de Assis tem com os leitores durante os livros que me faz gostar tanto da escrita do autor. Como se Machado de Assis semeasse propositadamente perguntas ou reflexões nos livros no sentido de pôr os leitores a pensar sobre elas. "Memórias Póstumas de Brás Cubas" do mesmo escritor também é uma obra muito interessante, acho que lhe vai agradar também.
Boas leituras
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