Sinopse:
"«A transformação social. A contestação. Personagens em
diálogos. As cruentas desigualdades sociais. Surgem as perguntas proibidas.
Vai-se adquirindo consciência e espaço, para que tudo se levante do chão. Um livro
composto por 34 capítulos. No 17.º está a tortura e a morte de Germano Santos
Vidigal. Germano, o nome que significa irmão, o homem da lança. Apesar de
vencido, o sacrifício da sua vida indica o caminho. ""Já o
encontraram. Levam-no dois guardas, para onde quer que nos voltemos não se vê
outra coisa, levam-no da praça, à saída da porta do sector seis juntam-se mais
dois, e agora parece mesmo de propósito, é tudo a subir, como se estivéssemos a
ver uma fita sobre a vida de Cristo, lá em cima é o calvário, estes são os
centuriões de bota rija e guerreiro suor, levam as lanças engatilhadas, está um
calor de sufocar, alto. ""As mulheres são também chamadas à primeira
linha das decisões neste belo romance de Saramago. O diálogo monossilábico entre
marido e mulher da família Mau-Tempo vai-se alterando. Interessante observar
uma narrativa que vai da submissão ao sentido de libertação, através de
gerações.» (Diário de Notícias, 9 de Outubro de 1998)"
In wook.pt
Comentário:
Publicado em 1980, este é talvez o primeiro grande êxito literário
de José Saramago. Se bem que não possua o fôlego e a criatividade do Memorial
do Convento (livro que se segue a este na cronologia literária de Saramago),
esta obra é o romance mais arrepiante, mais comovente e mais humano que
Saramago escreveu.
Levantado do Chão é
povo em estado puro; é luz na escuridão da seara, poesia escrita no sangue dos
seareiros escravizados pela tirania salazarenta. É toda a dor de um povo, todo
o sofrimento de gente condenada a viver sob o jugo ignominioso do fascismo.
Todos aqueles que nunca compreenderam e condenaram por
preconceito ou ignorância a Reforma Agrária, deviam ler este livro e refletir
sobre toda a realidade negra que ele encerra.
Este é talvez o livro mais humano que o nosso grande Mestre
escreveu; chega a ser doloroso ler todo este sofrimento. Porque sabemos que
esta ficção teve uma base tristemente real. O Cabo Tacabo que ria quando os
pobres (apanhados a colher bolota que não era sua) foram condenados a lutar,
pai e filho, para gaudio dos guardas; os latifundiários que escravizavam os
seus trabalhadores; a pide que torturava quem trabalha porque um dia pediram
pão e humanidade aos seus patrões e por isso foram apelidados de comunistas. Os
comunistas, esses monstros que a pide fabricou para esconder os seus próprios
crimes. E o povo, que nada sabe de política mas que era esmagado para que
alguns repartissem o fruto do deu trabalho.
Quem diz, cheio de
sabedoria, que o 25 de Abril trouxe exageros não sabe o que são exageros. Não
sabe o que foram estas vidas e estas mortes; este suor e este sangue vertido em
nome dos pecados dos outros.
E a Igreja católica, covarde e a alimentar-se da mesma manjedoura.
Como dizia o Padre Agamedes, “Igreja e Latifúndio, duas pessoas da Santíssima
Trindade, sendo a terceira o Estado”…
Mas um dia ELES
LEVANTARAM-SE DO CHÃO. Um dia os operários e camponeses deram sentido ao
sangue derramado. Para desespero dos criminosos.
E não digam, por favor, que isto é ideologia. Isto é
sofrimento. Isto foram vidas, milhares de vidas que se perderam no meio de searas
pintadas de vermelho.
Pode não ser o melhor livro de Saramago. Mas é um dos livros
mais revoltantes que li até hoje.