terça-feira, 30 de dezembro de 2014

The Chimes (Os Sinos de Ano Novo) - Charles Dickens


Comentário:
O  Natal de Mr. Scrooge é talvez o conto de Natal mais lido no mundo. Ele tornou-se um hino e  um símbolo dos valores humanos que rodeiam esta época festiva. No entanto, este conto, Os Sinos do Ano Novo, muito menos divulgado, não se pode considerar em nada inferior ao consagrado Scrooge.
Com o título original The Chimes, Os Sinos do Ano Novo foi publicado pela primeira vez em 1844, exactamente um ano depois do conto de Natal.
Talvez se note neste conto alguma influência de Victor Hugo (ou mera coincidência?): a simbologia dos sinos havia sido explorada de uma forma semelhante pelo grande mestre da literatura francesa treze anos antes quando, em 1831, foi publicado o belíssimo Notre-Dame de Paris, onde o famoso Corcunda de Notre-Dame convivia diariamente com os sinos da majestosa catedral da capital francesa.
É curioso que, tal como no grande romance de Hugo, também aqui os sinos não simbolizam a alegria da época festiva; não são sinos de júbilo ou de felicidade; são sinos que marcam o ritmo de um tempo em que nada se modifica. O ambiente do interior da igreja e do campanário faz também lembrar as descrições lúgubres do interior da Notre Dame habitada pelo corcunda; um ambiente soturno e triste.
Assim, os sinos não anunciam nada de novo, da mesma forma que o próprio Ano Novo não anuncia nada de feliz. Na verdade, uma das mensagens fundamentais do livro é precisamente essa: não há razão para festejar o novo ano porque a injustiça e a pobreza continuarão a reinar.
Nunca é demais realçar a sensibilidade para as questões sociais que Dickens demonstra. Ainda antes do aparecimento das ideias socialistas ele anuncia um tempo de contestação que será determinante para temperar essa fase de profundas desigualdades que foi a época vitoriana.
Mesmo os contos mais belos de Dickens têm o condão de revelar o Mal nas suas facetas mais macabras e mais pérfidas. Para quem espera um belo conto de Ano Novo é por vezes doloroso enfrentar as descrições que Dickens faz da maldade, da injustiça e das desigualdades daquele tempo. Daquele tempo e de todos os tempos.
No entanto, na tristeza também há poesia. E até alguns laivos de felicidade. 
Um livro curto, simples, direto, onde está patente toda a beleza da escrita de Dickens, talvez o melhor narrador de todos os tempos. 
E para todos os leitores deste blogue UM BOM ANO NOVO.

sábado, 27 de dezembro de 2014

AvóDezanove e o Segredo do Soviético - Ondjaki

Comentário:
À medida que vou avançando para o interior da obra de Ondjaki, menos provável se torna a hipótese de um dia me dececionar. Todos (ou quase todos) os génios da literatura têm um ou outro livro que nos desagrada. Neste maravilhoso escritor angolano tal parece ser impossível. Impossível não gostar. Impossível não sorrir e não sonhar; impossível não sentir aquela poesia e, acima de tudo, aquela ternura dos meninos de Luanda, a fazer lembrar os Capitães da Areia, ou seja, os Meninos do Rio do Jorge Amado!
As crianças desempenham um papel fulcral nas obras de Ondjaki; e a explicação envolve, entre outros fatores, o facto de o autor ser, ele próprio uma criança, embora tendo já perto de quarenta anos. Mas ele é uma criança no sonho, na esperança, na poesia.
Depois há o humor; com uma estória destas era impossível não sorrir e mesmo ceder à gargalhada sincera. Há pormenores simplesmente hilariantes, como os jacós (papagaios) com as suas sentenças políticas ou frases de telenovela brasileira. Outra nota de humor tem a ver com a alcunha da avó: dezanove. Não vou, obviamente, revelar, mas trata-se de algo que reflete a fineza e essa ingenuidade pueril que tanto enriquece a escrita de Onjaki.
É, portanto, um livro extraordinariamente divertido; e a melhor prova dessa qualidade é o facto de o ter lido praticamente na totalidade durante uma longa sessão de quimioterapia! Mesmo no meio da desgraça, este livro, acreditem, é capaz de nos fazer rir e sorrir.
No entanto, para lá desta dimensão lúdica, há um fundo muito sério no enredo deste livro. Se em Bom Dia Camaradas se elogia a presença dos cooperantes cubanos, neste livro aborda-se numa perspetiva muito crítica a presença dos militares soviéticos na Angola do pós independência. Uma perspetiva crítica que se centra numa hipotética construção de um gigantesco mausoléu para o “camarada presidente”. No entanto, as crianças lideraram a revolta; e o povo haveria de resistir, substituindo a inauguração do mausuléu por um memorável espetáculo.

Sinopse
As obras do Mausoléu que irá albergar os restos mortais do presidente da República estão quase a terminar. Os habitantes do bairro vizinho descobrem que as suas casas serão destruídas porque o espaço circundante ao monumento será requalificado. Duas crianças decidem explodir o Mausoléu e assim poupar o bairro onde sempre viveram. Entretanto o responsável pela obra, um soviético, apaixona-se pela avó de uma das crianças. Entretanto essa avó tem de ser operada para lhe amputarem um dedo do pé. Entretanto existe uma outra avó que aparece muito mas não existe. Entretanto o plano das crianças falha, mas o Mausoléu é destruído…
in www.wook.pt

domingo, 14 de dezembro de 2014

A Chave de Salomão - José Rodrigues dos Santos


Comentário:
Dos livros que já li do autor, este é, na minha opinião, o menos bem conseguido. Isto deve-se, essencialmente, a um menor ajuste entre a componente de divulgação cientifica e o enredo ficcional. Principalmente na primeira metade do livro o leitor tem dificuldade  em  ligar esses dois vetores e as explicações cientificas parecem surgir um pouco desajustadas em relação ao enredo. No final do livro, o ensaio de uma teoria do tudo parece-me algo forçada. Se décadas de esforço dos mais conceituados físicos não conseguiram chegar a tal teoria é pouco credível que um chefe da CIA consiga tal feito; ainda mais baseado num pressuposto demasiado incrível: o da consciência do Universo que acabaria por desempenhar o papel do tal "observador" capaz de criar o real através do processo de transformação das ondas em partículas e assim explicar a unificação do quântico com o nível macroscópico.
Pela positiva, há que destacar, mais uma vez,um enredo empolgante, com incerteza até final, se bem que marcado pelos habituais clichés deste tipo de literatura: o herói que aparece no último segundo quando a heroína está prestes a ser sacrificada, assim como o inevitável desfecho romântico.
Mas, ainda assim, subsiste o lado mais positivo dos livros de JRS: a divulgação cientifica, com explicações simples de problemas tão complexos como a eterna luta pela conciliação da física clássica com a física quântica. Personagens históricas tão magníficas como Niils Bohr e Albert Einstein são aqui apresentados de forma muito pedagógica e mostrando-nos mesmo um lado humano de génios como Einstein que também eram capazes de se enganar. Pelo meio, merece  também destaque a  explicação, muito simples e eficaz, desse fenómeno que foi a descoberta do campo de Higgs, tão importante para a física contemporânea.   Há alguns anos  atrás todos ouvimos falar do Bosão de Higgs, a Partícula de Deus, criadora da matéria resultante do Big Bang, que JRS  aqui nos explica de forma muito clara.
Em suma, este livro resume bem os segredos do sucesso de JRS, com os seus melhores méritos mas deixa indícios de algum "empolgamento" que ameaça levar longe demais este perigoso equilíbrio entre ficção e ciência.

Sinopse:
O corpo de Frank Bellamy, o director de Tecnologia da CIA, é descoberto no CERN, em Genebra, na altura em que os cientistas procuram o bosão de Higgs, também conhecido por Partícula de Deus. Entre os dedos da vítima é encontrada uma mensagem incriminatória. 
The Key: Tomás Noronha
A mensagem torna Tomás Noronha o principal suspeito do homicídio. Depressa o historiador português se vê na mira da CIA, que lança assassinos no seu encalço, e percebe que, se quiser sobreviver, terá de deslindar o crime e provar a sua inocência. 
Ou morrer a tentar. 
Começa assim uma busca que o conduzirá às mais surpreendentes descobertas científicas alguma vez feitas. 
Será que a alma existe?
O que acontece quando morremos?
O que é a realidade?
Com esta empolgante aventura que arrasta o leitor para o perturbador mundo da consciência e da natureza mais profunda do real, José Rodrigues dos Santos volta a afirmar-se como o grande mestre do mistério. Apesar de ser uma obra de ficção, A Chave de Salomão usa informação científica genuína para desvendar as espantosas ligações entre a mente, a matéria e o enigma da existência.
Sinopse in www.wook.pt

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

A Longa Noite sem Lua - John Steinbeck


Comentário:
Escrito em 1942, esta obra de Steinbeck nunca foi, que eu tenha conhecimento, publicada em tradução portuguesa (de Portugal). A edição que li foi, portanto, a tradução brasileira.
Este livro revela-nos um Steinbeck muito diferente daquele a que estamos habituados pela leitura das suas grandes obras. The Moon is Down (A Longa Noite sem Lua na tradução brasileira) foi escrito em 1942, já em plena fase de maturidade do escritor, três anos depois da sua obra-prima, As Vinhas da Ira. Mesmo assim, este pequeno livro não deixa de ter algo de experimental, ao abordar uma temática pouco habitual no autor: a estória de uma cidade imaginária, ocupada por um inimigo enigmático, através da invasão militar, quase sem oposição. É bom lembrar que o ano de 1942 situa-se em plena segunda guerra mundial, em que a pátria do autor também esteve envolvida (EUA).
Vivia-se o terror nazi no seu auge, um pouco por toda a Europa mas com especial incidência na França, esse país mártir que deu ao mundo um exemplo de coragem através da famosa resistência francesa, à qual o livro parece prestar uma homenagem implícita.
Uma cidade qualquer, num país que podia ser a França, ocupado por outro país, que podia ser a Alemanha, numa guerra idiota que podia ser a segunda guerra mundial. Neste livro, o ”prefeito” é um homem passivo, um bom homem mas sem coragem para atos heroicos; ele vai tentado gerir a ocupação de forma pacífica, levando ao limite o seu esforço para acalmar a ira dos ocupantes. Mas nunca o prefeito deixou de acreditar naquele que é o verdadeiro herói do livro: o povo da cidade. Ele acredita que, seja qual for a sua atitude, um dia o povo se revoltará e o agressor tornar-se-á vítima. É esta a mensagem do livro: nada pode domar a vontade de um povo, por mais oprimido que ele seja.
E ao longo do livro, a premonição do prefeito vai-se concretizando; lentamente, a euforia de quem possui as armas vai-se esvaindo, à medida que a resistência do povo vai triunfando. A meio do livro, já os oficiais invasores, extenuados perante uma ocupação sob grande resistência, vão reconhecendo: “A cidade foi conquistada e estamos com medo; foi conquistada e estamos cercados.” Premonição perfeita do que viria a ser o desfecho da guerra: os nazis viriam a ser vencidos pelo desgaste.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Adultério - Paulo Coelho


Comentário:
Na mais positiva das leituras, este é um livro sobre a eterna inquietude do ser humano; sobre aquilo que António Variações chamava de Estar Além: só querer estar onde não estou, só querer ser o que não sou. Há no ser humano qualquer coisa que não se adapta à quietude, à paz de espírito; há sempre necessidade de algo mais, não necessariamente material; é por isso que a paz é tão difícil de obter.
Por outro lado, algo nos vai dizendo, ao longo da leitura que estamos perante um livro banal. No centro do enredo está a velha e mil vezes repetida questão dos limites do normal; a questão de saber se a loucura a que qualquer ser humano é levado pelas circunstancias, muitas vezes pela inquietude que referi, não é afinal um estado de “normalidade”. Mas, sinceramente, sobre esse assunto será possível que Paulo Coelho vá mais longe do que já foram os também brasileiros Machado de Assis e Clarice Lispector? Não me parece.
Depois vêm os lugares comuns a fazer lembrar a mais vulgar literatura de autoajuda: a medicina não dá respostas; apenas vende. O ioga e as técnicas orientais de meditação também não… 
A mais descarada banalidade e, ao mesmo tempo, uma generalização abusiva, mas que fica sempre bem num livro de Paulo Coelho:
“Os homens traem porque está no seu sistema genético. A mulher o faz porque não tem dignidade suficiente, e além de entregar seu corpo acaba sempre entregando um pouco do seu coração”.
Mas aqui está uma das grandes razões do sucesso dos livros deste autor: ele diz exatamente aquilo que a maioria dos leitores quer ler.
A vida exige desafios; quando eles não existem, o indivíduo tende a procurar situações de risco e aventura que, regra geral, resultam em comportamentos que conduzem à autodestruição. Isto não é uma descoberta de Paulo Coelho; é uma caraterística da alma humana há muito conhecida; o que o autor faz é apenas ilustrá-la com o exemplo típico da pessoa que, aparentemente, tinha tudo para ser feliz e que se vai auto-destruindo. Como é óbvio, “aparentemente” é a palavra-chave neste processo. E o grande problema deste livro é que tudo é demasiado óbvio; demasiado comum. E a literatura, como arte que é, exige algo mais que o banal.
Pela parte que me toca, acho que já esgotei a minha paciência para com Paulo Coelho; respeito o sucesso que tem e o bem que faz a muita gente que já o leu e com ele ganhou algo. Só por isso, já Paulo Coelho merece o reconhecimento que tem. Mas a mim já nada de novo diz…

Sinopse:
Uma mulher, casada, mãe de dois filhos, e jornalista de carreira, começa a questionar a rotina e a previsibilidade dos seus dias. Ao olhos de todos, tem uma vida perfeita: um casamento sólido e estável, um marido dedicado, filhos alegres e felizes, um trabalho que a faz sentir-se realizada. Contudo, já não é capaz de suportar o esforço necessário para fingir que é feliz, quando a única coisa que sente pela vida é uma enorme apatia. Tudo muda quanto reencontra, acidentalmente, um antigo namorado da sua adolescência. Quando se reencontram, desperta nela uma inesperada e violenta paixão, e fará tudo o que seja preciso para conquistar esse amor impossível.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

A Guerra dos Mundos - H. G. Wells


Comentário:
Antes de mais nada convém esclarecer uma confusão que também eu possuía antes de ler este livro: Orson Welles foi um cineasta e produtor de rádio e H. G.Wells foi o verdadeiro autor deste livro; a semelhança dos apelidos costuma gerar confusões.
Quando A Guerra dos Mundos, de Herbert George Wells foi adaptada a um programa de rádio, da responsabilidade de Orson Welles, em 1938, gerou um pânico enorme na população de Londres, uma vez que a obra retrata, de uma forma muito realista, uma invasão de marcianos. 
Para compreendermos tal fenómeno, convém fazer um pequeno enquadramento na época: 1938 foi o ano anterior ao início da Segunda Guerra Mundial; nessa altura, Hitler era uma séria ameaça à paz na Europa e podemos afirmar que o medo já estava bem patente na maioria dos cidadãos ingleses. O impacto de tal emissão é facilmente explicado por esse clima, aliado à genialidade do escritor Wells e do radialista Welles.
Por outro lado, convém ter em conta a época em que o livro foi escrito (1898). Vivia-se um clima de euforia na Europa, um tempo de prosperidade, mas também era claro que essa prosperidade escondia uma ameaça gigantesca: as grandes rivalidades na Europa que haveriam de conduzir à primeira guerra mundial; portanto, podemos afirmar que o livro é duplamente premonitório: podemos encarar a sua publicação como uma premonição da Primeira Guerra Mundial e a emissão de rádio é uma espécie de antecipação da Segunda.
Quanto ao livro em si, só encontro uma palavra para o definir: empolgante. Wells apresenta-nos e invasão como algo menos estranho à realidade do que possa parecer; logo no início do livro, ele adverte o leitor para esta verdade tão simples: porque é que havemos de estranhar uma invasão extraterrestre se toda a história do próprio homem está cheia de destruições maciças, provocadas pela sua própria agressividade? 

Repare-se   nas palavras do autor:

"Antes de formularmos a seu respeito um juízo demasiado severo, devemos recordar-nos que destruímos, implacável e totalmente, não apenas animais, como o bisão e o dodó, mas também raças inferiores. Os dasiúros, apesar da sua semelhança com os homens, foram inteiramente aniquilados no decorrer de uma guerra de extermínio empreendida por imigrantes europeus no espaço de cinquenta anos. Seremos tão piedosos que tenhamos o direito de nos lamentar se os marcianos fizerem a guerra movidos pelo mesmo espírito? "


Quanto aos marcianos que  invadem Inglaterra, há neles caraterísticas que merecem destaque pelo seu tremendo simbolismo. Por exemplo, eles não têm aparelho digestivo; “Eram cabeças – meras cabeças”. É impressionante como as caraterísticas aparentemente “monstruosas” dos marcianos não são mais do que a projeção de uma eventual continuação da evolução do homem, no sentido darwiniano, ou seja, fazendo com que órgãos ou membros menos úteis desapareçam (nariz externo, orelhas, cabelo, unhas, queixo, etc.) ao mesmo tempo que se desenvolvem de forma desmesurada os órgãos mais importantes, nomeadamente o cérebro e as mãos.
Da mesma forma, o aparelho digestivo reduz-se e o alien acaba por se alimentar diretamente do sangue das presas. Impressionante. Mas não é assim o ser humano enquanto predador?
A visão algo apocalíptica do autor é reforçada pela opinião negativa que ele emite sobre a natureza do ser humano, bem explícito no exemplo do padre. Trata-se de um homem da religião que manifesta um caráter problemático, egoísta, maldoso. Em plena contradição com o próprio pensamento religioso.
Outro pormenor curioso é o facto de um dos personagens principais, o artilheiro, através do seu discurso e dos seus planos, representar a crença na construção de um futuro melhor para a humanidade através de uma espécie de nova seleção natural, em que os mais fracos, os inúteis, são eliminados. Assim, há uma espécie de aproveitamento do lado positivo da desgraça: de como a “razia” provocada pela guerra (neste caso frente aos marcianos) funciona como uma forma de selecionar os melhores. 
O final do livro é interessante e, mais uma vez cheio de simbolismo; sem querer revelar o desfecho do enredo, é importante dizer que o maior inimigo da humanidade, ao longo dos seus 2,5 milhões de anos de História pode ser, ao mesmo tempo, a sua melhor defesa.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

A Fórmula de Deus - José Rodrigues dos Santos

Comentário:
Aquilo de que não gostei neste livro resume-se a muito pouco: algum exagero nas explicações científicas, por vezes repetitivas, redundantes mesmo. Esse aspeto retira alguma fluidez à leitura e pode desagradar a leitores mais desejosos de um ritmo narrativo rápido. Mas fica por aqui a minha crítica negativa.
O que de positivo posso dizer é muito mais significativo. Sem tirar  interesse às aventuras de Tomás Noronha, JRS oferece-nos um presente notável: uma obra de divulgação cientifica riquíssima, a fazer lembrar o grande e saudoso Carl Sagan. O livro tem 570 páginas mas só consigo fazer uma pequeníssima ideia dos milhares de páginas que o autor leu para compor esta obra. 
Tudo começa com uma enigmática conversa entre Einstein e o antigo primeiro ministro israelita Ben Gurion. Dessa conversa resultou a elaboração, pelo génio da ciência, de um documento cientifico que, na interpretação dos espiões norte-americanos e, mais tarde, dos serviços secretos iranianos, de um plano para uma bomba atómica potente e acessível. Lentamente, ao longo do livro, JRS vai dando pistas para que o leitor vá descobrindo que o conteúdo do tal documento é bem diferente. No entanto, é o "nosso" Tomás Noronha que se vê "emparedado" entre americanos e iranianos. 
Pelo meio fica um admirável passeio pelos mais diversos aspetos da evolução do conhecimento cientifico no século XX pós-Einstein, especificamente no domínio da Física. 
Paralelamente, o autor oferece-nos interessantes reflexões sobre a natureza do pensamento religioso e suas relações, sempre explosivas, com o poder político.
Depressa a obsessão pelas armas nucleares vai dando lugar a uma outra obsessão da humanidade: a existência de Deus perante a validade sempre relativa do conhecimento científico. O interesse do livro atinge o clímax quando o leitor é levado a constatar das fronteiras tão ténues entre a física e a metafísica ou, em última análise, entre a ciência e a religião. A aceitação de um Deus criador não está, afinal, tão distante da realidade da própria ciência.
O final do livro, embora não tenha agradado a muitos dos aficionados da escrita de JRS é, a meu ver, belíssimo. A mensagem final tem tanto de surpreendente como de genial pela forma como o leitor é levado a reflectir sobre questões tão fundamentais como a existência de Deus, a origem, os limites e o futuro do Universo e da humanidade.
Em jeito de conclusão: não sendo um génio de criação literária, José Rodrigues dos Santos compensa essa lacuna com um imenso trabalho de preparação e elaboração das suas obras, ao mesmo tempo que revela um certo talento na gestão do "suspense" que imprime ao enredo, levando o leitor a uma certa avidez na leitura. 

Sinopse:
Nas escadarias do Museu Egípcio em pleno Cairo, Tomás Noronha é abordado por uma desconhecida. Chama-se Ariana Pakravan, é iraniana e traz consigo a cópia de um documento inédito, um velho manuscrito com um estranho título e um poema enigmático.
O inesperado encontro lança Tomás numa empolgante aventura, colocando-o na rota da crise nuclear com o Irão e da mais importante descoberta jamais efectuada por Albert Einstein, um achado que o conduz ao maior de todos os mistérios: a prova científica da existência de Deus.
Uma história de amor, uma intriga de traição, uma perseguição implacável, uma busca espiritual que nos leva à mais espantosa revelação mística de todos os tempos.
Baseada nas últimas e mais avançadas descobertas científicas nos campos da física, da cosmologia e da matemática, A Fórmula de Deus transporta-nos numa surpreendente viagem até às origens do tempo, à essência do universo e o sentido da vida.
in www.wook.pt