sábado, 27 de julho de 2013

A Flecha Negra - Robert Louis Stevenson


Sinopse:
O temerário mas inexperiente Richard Shelton, que em nome da justiça e da lealdade se lança até no mais desigual dos combates, é o herói desta aventura. A ação de “A Flecha Negra”, a obra de Robert Louis Stevenson que começou por ser publicada em folhetim em 1883, decorre nos primeiros anos da Guerra das Duas Rosas, um conflito pelo domínio territorial e pela sucessão ao trono que colocou em confronto as casas inglesas de York e Lancaster. Uma guerra, em pleno século XV, feita de frágeis e pouco duradouras alianças entre as mais influentes famílias do país. 

Comentário:
Mais do que uma intensa e apaixonante aventura, este livro é um testemunho histórico muito fiel e cheio de beleza; daquele encanto que só o mundo medieval, carregado de heroísmo, pode trazer. Estamos perante mais uma obra representativa do período romântico da literatura britânica, da primeira metade do século XIX e que hoje se junta àquele estranho conjunto de livros a que o vulgo chama “literatura infanto-juvenil”. Pronto, confesso que embirrei com isto! Porquê “infanto-juvenil”? Desde quando estes romances apaixonantes, cheios de mistério e ação, se destinam apenas ou preferencialmente aos jovens? Isto, meus amigos, é literatura para todas as idades!
Dizia eu que este livro é um testemunho histórico apaixonante. A ação decorre na fase final da Idade Média, quando a Grã-Bretanha se encontra mergulhada num duplo conflito: a nível externo, a Guerra dos Cem Anos, que colocou frente a frente a França, com os seus aliados, e a Inglaterra, também com os seus aliados, entre os quais Portugal. Este conflito que, na verdade, durou mais de 130 anos, transformou os franceses em inimigos eternos e, no livro, eles são uma espécie de fantasmas que ameaçam constantemente as costas inglesas.
Mas há o não menos terrível conflito interno: a famosa Guerra das Rosas, entre as duas maiores casas nobres de Inglaterra: a de Iorque e a Casa de Lencastre, de onde haveria de provir a nossa famosa rainha D. Filipa.
Em Inglaterra, se não nos batemos por um lado, temos de nos bater pelo outro”, lamentava-se o herói deste livro, o jovem cavaleiro Richard Shelton (Dick). Era esta a dura realidade de um reino dividido numa guerra fratricida entre as duas casas, representadas pela rosa vermelha de Iorque e a rosa branca de Lencaster. Desta forma, cada cidadão inglês vivia rodeado de inimigos e o seu objetivo número um era sobreviver; neste contexto, a Inglaterra tornara-se um verdadeiro covil de ladrões e um mundo de esfomeados e desesperados. E a sobrevivência só era possível tomando partido por um dos lados. É por isso que neste livro não há bons nem maus. 
Este foi o terreno fértil para o mítico Robin dos Bosques e foi-o também para os justiceiros deste livro, os homens da flecha negra, com que marcavam cada ataque aos privilegiados daquele tempo.

Trata-se de um belo romances de aventuras, um livro marcante deste género literário, indispensável a quem gosta de aliar a história à literatura.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

O Voo do Noitibó - João Lobo


Sinopse:
Em O Voo do Noitibó, João Lobo, fiel a uma gramática de procura e indagação, desentranha seis histórias de criaturas nimbadas pelo sortilégio do tempo natural, daquele tempo que está para além dos espaços físicos e dos marcos históricos, e que encontra medida no ádito improfanado da memória, e preexiste às circunstâncias dos factos que confundem os sentidos e cegam o entendimento do homem hodierno.
In caligrafo.pt
Comentário:
O noitibó é um pássaro noturno; mais do que isso, ele é a noite; o símbolo vivo da escuridão e das sombras que a povoam. Da mesma forma, este livro é a expressão da noite humana e dos mistérios com que a natureza envolve os homens.
Confesso que o início da leitura foi difícil. João Lobo coloca nestes contos toda a linguagem como expressão da alma deste povo minhoto, possuidor de um linguajar cheio de preciosidades linguísticas. Nesse âmbito, esta obra funciona como uma espécie de repositório de um vocabulário que ameaça o esquecimento. E grande parte do encanto desta leitura reside precisamente nesse imenso desafio que se coloca ao leitor: entrar na linguagem como porta de acesso à alma popular.
Em algumas passagens, este livro faz lembrar alguns dos escritores neorrealistas portugueses mas especialmente o grande Aquilino Ribeiro. Tal como na obra do grande mestre, também, em João Lobo sentimos o perfume da terra e a alma popular.
No entanto, em algumas passagens do livro, o aspeto quase barroco da linguagem dificultam de tal maneira a tarefa do leitor que a dimensão lúdica da leitura quase se perde.
Quando João Lobo consegue conciliar essa alma popular, esse sentimento de pertença à terra com uma narrativa minimamente interessante para o leitor, o livro assume caraterísticas bem interessantes, como no conto “Belzebu”, em que se exprime uma mensagem original e bem atraente: a ideia segundo a qual, mais do que um espírito divino, todos nós, seres humanos partilhamos um pouco do mal universal; uma espécie de bafo do diabo…

Em conclusão, podemos dizer que estamos perante um livro de difícil leitura e interpretação mas com um grande valor antropológico e linguístico. A preocupação maior do autor não foi escrever uma obra atrativa; foi deixar para a posteridade uma memória viva de um povo, bem como de toda a força da sua expressão linguística.

domingo, 21 de julho de 2013

O Conde de Monte-Cristo - Alexandre Dumas



 
Sinopse
A história de um homem bom a quem roubam a liberdade e o amor. Um homem que regressará coberto de riquezas, vingador impiedoso e infalível, para além de toda a lei humana ou divina. Edmond Dantés quer reaver a mulher que amara, vingar-se dos seus inimigos, desafiar o destino…
Grande obra de um dos romancistas mais populares em todo o mundo e o mais célebre dos ficcionistas românticos franceses, autor de Os Três Mosqueteiros e A Tulipa Negra, entre outros.
«Quem disse que não vale a pena ler ou reler os clássicos? “O Conde de Monte-Cristo” é um dos absolutamente obrigatórios. As Publicações Europa-América fazem agora a reedição deste romance num exemplar de quase mil páginas que se lêem num abrir e fechar de olhos.» — 24 Horas
Um romance imortal. Um filme extraordinário do realizador de Robin Hood: Princípe dos Ladrões com Jim Caviezel, Guy Pearce e Richard Harris.

 in Wook.pt
Comentário:
Este é, se dúvida nenhuma, um dos livros mais emocionantes que li até hoje.
O Conde de Monte Cristo é, à partida, um exemplo monumental do romantismo literário francês do século XIX. Publicado no mesmo ano que Os Três Mosqueteiros, faz com este outro livro um par de obras monumentais, que deixaram Alexandre Dumas entre os mais geniais escritores de sempre.
Neste livro estão bem patentes todas as caraterísticas do género romântico: o heroísmo de um homem injustiçado, que combate pela vida e pela vingança; o testemunho histórico de uma época em que a honra de um homem tinha mais importância do que a própria vida; a visão romântica de um passado em que a ação humana poderia redimir pecado e corrigir injustiças.
Mas, a meu ver, há algo mais que marca o romantismo francês oitocentista, em algumas das suas obras mais relevantes: é que o heroísmo, neste livro por exemplo, não emerge necessariamente da honra dos nobres e tradicionais espadachins; emerge da pobreza, da injustiça e do sofrimento humano. O Conde de Monte Cristo, ou Edmond Dantès, não é comparável ao Quijote que luta pela honra da fidalguia nem sequer a um D’Artagnant que pugna por grandes ideais. Assim, esta tendência humanista do romantismo francês, fica claramente exposta neste livro, como n’Os Miseráveis, de Victor Hugo, aproximando-se mais do romance britânico de Stevenson.
É esta dimensão de defesa da justiça social, herdeira dos nobres valores da Revolução Francesa que tornou heroica a obra deste escritor. Como diríamos hoje, escritores como Hugo e Dumas foram verdadeiros escritores de intervenção.
Curiosamente, a maioria destes romances transformaram-se, no século XX, em livros conotados com a literatura infanto-juvenil. Custa-me entender porquê. Livros como O Conde de Monte Cristo devem ser lidos por qualquer pessoa que, simplesmente, goste de ler. O Conde de Monte Cristo é uma sublime obra-prima da literatura mundial.
Neste livro, qualquer leitor, jovem adulto ou idoso, devora as mais de 1500 páginas com uma vontade indómita de desvendar os mistérios e de galgar as etapas heroicas da vingança do desventurado Edmond Dantés. No entanto, quando Edmond, o infeliz, se transforma no rico e todo poderoso Conde de Monte Cristo, ele transforma-se também no redentor de todas as misérias e de todas as injustiças.
Mas nesta edição que me foi dado ler, nem tudo são rosas. A verdadeira mancha negra desta edição da coleção Geração Público é a tradução.
Os erros de tradução atingem o inacreditável no início do capítulo 100, onde podemos ler: “Todas as manhãs Morrel telefonava para Noirtier para saber notícias de Valentine…”
Esta frase, para além da repetição abusiva da palavra “para”, contém dois erros gritantes:
- O personagem Noirtier era mudo, pelo que nunca poderia informar nada por telefone.
- Mais incrível ainda: a primeira versão de telefone foi inventada em 1860 e Dumas acabou de escrever este livro em 1844!!!
Para tirar todas as dúvidas, procurei uma edição francesa. Encontrei o e-book no site do projeto Gutenberg e, afinal, a frase original é (pasmem):
Chaque matin Morrel venait chez Noirtier prendre des nouvelles de Valentine…”
Penso que não é necessário acrescentar nada…

quinta-feira, 18 de julho de 2013

A Lua e as Fogueiras - Cesare Pavese




Sinopse:
Publicado originalmente em 1950, A lua e as fogueiras é o último e mais bonito romance de Cesare Pavese. Neste romance, o personagem central retorna rico à cidade de Santo Stefano Belbo, de onde partiu ainda jovem para "fazer a América", pretendendo usufruir uma vida abastada. Não é mais o rapaz obrigado a trabalhar nos campos, mas um homem maduro que agora pode ser um patrão. Numa paisagem em que, aparentemente, nada mudou, encontra tudo transformado.
 in Skoob.com.br


Comentário:
Uma enorme surpresa, este livro. Depois da deceção que foi a leitura de Andrea Camilleri, encontrei neste Cesare Pavese algo completamente diferente.
 Quando um homem não conhece as suas raízes tudo perde o sentido. Enguia, o protagonista, é um bastardo que nunca conheceu os pais. Enriqueceu mas o apelo da terra foi, no entanto, maior. Mas as raízes perdidas, essas, nunca mais as encontrará…
Uma escrita profunda, sentida, poética, cheia de sentimento e emoção. O próprio título, A Lua e as Fogueiras, encerra um simbolismo tremendo, numa alusão ao universo rural e místico da Itália dos tempos da ditadura fascista e das fogueiras da guerra que assolaram o nosso continente em meados do século. A Lua, no seu esplendor místico, parece iluminar uma escuridão que se entranha no espírito dos homens e da qual o próprio Pavese foi vítima pois acabou por se suicidar poucos meses depois de ter terminado a escrita deste livro.
A solidão de um bastardo no meio do mundo. “Enguia” regressa à sua terra e, depois da solidão da América que o acolheu e onde enriqueceu, apenas encontra as cinzas das fogueiras; nem memórias vivas, apenas fantasmas… Nuto, o amigo é o que resta da guerra e da miséria. De resto, é a tristeza do presente, os ódios do passado, o medo do futuro e a pobreza de sempre.
Mas a agente simples não é mais infeliz que ele, que enriquecera. A miséria é também enganada pela alegria de quem nada tem a perder nem a ganhar. As festas, as desgraças, a música, a morte... Tudo é vida, mesmo sem futuro.
Enfim, uma imensa poesia sobre a vida real.
Uma obra-prima!
 

segunda-feira, 15 de julho de 2013

O Cheiro da Noite - Andrea Camilleri




Sinopse:
Desta vez trata-se de um caso anómalo, em que o cadáver não aparece no início, e Montalbano não é o titular, mas intromete-se. Demasiadas coincidências empurram-no. Investiga o desaparecimento de um financeiro burlão, que levou o dinheiro de meia vila e arredores, e mais tarde do seu ajudante. E a solução seria uma fuga banal, com o dinheiro subtraído aos muitos patos da época da bolsa, ligada a um homicídio.
Mas, bastante mais carregada de horror pungente, surge uma solução lateral, sobre cujo enigma Montalbano se debruça para ver, com a piedade que se sente pelo drama silencioso de certas existências, enquanto um estranho cheiro «a fruta podre, a coisas em putrefação» espalha, durante algum tempo, como que a sua profecia na noite de Vigàta.
«Então sentiu que a noite tinha mudado de cheiro: era um cheiro leve, fresco, era cheiro a erva nova, a cidreira, a hortelã.»
In wook.pt

Comentário:
Encetei a leitura deste livro por ter lido algures que Andrea Camilleri é um dos autores mais lidos em Itália. Mas depois de terminada a leitura, fico sem perceber porquê.
Trata-se de um enredo de cariz policial, povoado de lugares comuns, de clichés estafados. Nada nesta obra parece ser original ou minimamente criativo. O final é previsível e o desfecho é desmontado sem qualquer emoção ou incerteza quanto ao final.
As aventuras do inspetor Montalbano, na perseguição a um banal e previsível vigarista que extorqui fortunas a velhinhas desprotegidas desenrolam-se de modo pastoso, lento, num enredo pobre que se poderia resumir em meia dúzia de páginas.
O que se espera de um bom policial é um enredo rico em pormenores significativos e uma emoção crescente. Nada disse se encontra neste livro.
Uma deceção total. As referências a William Faulkner são forçadas, descontextualizadas e constituem até um certo abuso, tão grande é o abismo entre a escrita dos dois autores.
Alguns pontos positivos podem, mesmo assim, encontrar-se neste livro: a caricatura das especulações bolsistas e um sentido de humor que por vezes consegue fazer sorrir.