Eis uma bela história de amizade e amor, assim como uma bela
reflexão sobre a importância dos sentimentos na vida.
Há vários tipos de romances, mas há um aspecto em que se
podem dividir entre duas categorias: os que se constroem a partir de
acontecimentos inusitados, surpreendentes, com os quais se fazem grandes
enredos e aqueles que abordam as vidas normais, das pessoas normais, em que
nada de extraordinário acontece. Porque o normal, o habitual, é que nada de
anormal aconteça. Este livro pertence a esta segunda categoria de romances. Trata-se
de um enorme passeio pela vida de quatro personagens, quatro jovens amigos
(Sara, Bárbara, Luís e Tiago), entre os quais se vão sucedendo sentimentos por
vezes contraditórios e geradores de conflito: amizade, amor e ciúme. Para lá
dessa juventude intensa, vivida em sobressalto interior, ficaram quatro vidas
que podiam ter sido diferentes. No entanto, o que interessa isso? Pouco mais
interessa do que a realidade, por mais normal que seja. E o amor; sempre o amor
a comandar a vida das pessoas simples.
Nota-se neste livro uma certa continuidade em relação à
primeira obra do autor (Olhei Para Trás e Sorri): o quotidiano nas sua
simplicidade, nos mistérios simples e profundos que escondem grandes dilemas
interiores, embora talvez imperceptíveis aos olhos dos outros.
Na escrita de Pedro de Sá, o importante não são os factos,
os acontecimentos. O importante é a sua vida mental, fazendo lembrar Chico
Buarque, cujas obras me vieram à memória várias vezes durante a leitura, pelo
privilégio que dão à vida interior dos seus personagens: aquela inquietude
permanente, a ânsia continua de combater o vazio e o silêncio: o ser humano reage
mal ao vazio; é necessário, pelo menos, falar, quanto mais não seja para não
estar calado porque o silêncio é oco. O vazio é não sentir. Não sentir é
desumano. É por isso que é preciso amar. Ou odiar. A paixão inesperada de Luís
e Sara é algo que, embora breve e fugidio, afectará a vida inteira de ambos. Pouco
mais que uma troca de olhares e tudo será diferente, pelo menos na vida mental
deles. Sim, porque a vida normal não pode escapar ao império da rotina, ao rumo
natural de um rio que desce a montanha pelo lado mais suave: o da apatia, da
rotina, da inacção.
Breve e intensamente, a chama irrompeu entre Luís e Sara.
Uma chama intensa, morta ao nascer, porque era preciso prosseguir a vida, sem o
sobressalto do amor inesperado e proibido pela amizade.
“Luís perdia-se em Bárbara”. Luís, um “habitante da solidão”.
Depois de ler este livro, confesso que continuo sem entender
porque é que esta editora pouco ou nada fez por promover uma obra como esta, ao
mesmo tempo que outras montam máquinas gigantescas de marketing para promover
verdadeiro lixo.
Este livro tem qualidade. Muita qualidade. Custa-me,
confesso, vê-lo publicado desta forma. Merecia claramente mais. Muito mais.