quinta-feira, 3 de julho de 2014

Acabadora - Michela Murgia


Sinopse:
Numa pequena vila sarda, a velha costureira, Ti Bonaria, acolhe Maria, «cedida» a ela por uma família humilde com muitos filhos. Oferece à sua «filha da alma» uma profissão e estudos, uma escolha audaciosa para uma mulher na Sardenha dos anos cinquenta. Maria cresce rodeada de ternura; mas há certos aspetos da vida da Ti Bonaria que a incomodam, em particular as suas ausências noturnas. Ela não sabe que a velha é a acabadora, a «última mãe», a mulher que ajuda os que sofrem a morrer. No dia em que descobre, a sua vida muda por completo e serão necessários muitos anos para que consiga perdoar à sua mãe adotiva. Com uma linguagem poética e essencial, Michela Murgia cria duas personagens inesquecíveis numa Sardenha intemporal, de costumes fascinantes.
in www.wook.pt
Comentário:
Eis como se pode escrever de forma agradável sobre a eutanásia; este é o melhor elogio que se pode fazer a este livro. Sobre um tema tão lúgubre, em que a morte está por todo o lado; sob um ambiente tão "pesado", a autora submete a morte ao amor. 
Esta não é uma obra-prima nem pretendeu ser; é um livro simples, que se lê num ou dois serões, com uma escrita profundamente poética mas ao mesmo tempo simples e objetiva. Ou seja, sendo um livro sobre algo que é por natureza doloroso, não deixa de ser uma leitura agradável e mesmo bastante positiva.
Mesmo assim, por detrás da aparente leveza da escrita não deixa de estar uma Itália profundamente triste e deprimida, saída da segunda guerra mundial, em que o fascismo de Mussolini provocou a devastação e a miséria. A comunidade rural da Sardenha, de onde é originária a protagonista, é retratada como palco da mais sórdida miséria, onde as famílias dificilmente conseguem sobreviver com dignidade. Esta realidade sócio económica é agravada por um quadro mental extremamente conservador, onde reina a superstição. Este conservadorismo, escondido por detrás de tradições e de uma moral apenas aparente, constitui um quadro de obscurantismo que prevalece nesta velha Europa, ainda e sempre dominada pelo preconceito.
Mas a critica social e de costumes não são as alavancas principais deste livro; ele ganha força, sobretudo, com a dinâmica emocional; não direi que é um livro escrito para fazer chorar as almas mais sensíveis mas anda muito perto disso; é uma obra que se dirige muito mais ao coração do que há racionalidade de quem lê.
Não é, por tudo isto, um livro de grande excelência literária; mas é um livro que encerra uma mensagem polémica e atual e, como toda a literatura de qualidade é uma obra capaz de fazer refletir o leitor.
Sendo um livro muito pequeno, com uma escrita muito sintética e um enredo muito linear, não é uma obra de profundo alcance literário. Mas vale bem todos os minutos que empregamos na sua leitura.

7 comentários:

Ana C. Nunes disse...

Eu gostei bastante deste livro, só não gostei foi de alguns capítulos da última parte. De resto a escrita é maravilhosa!
Tenho pena que não vás ao encontro do clube, no próximo sábado, mas é bom saber a tua opinião, sempre muito bem redigida.

Unknown disse...

Tenho um compromisso familiar, por isso não irei. Mas gostei muito do livro,sim.

Francisco disse...

Vou procurar ler o livro. Estou curioso. Não conhecia a escritora.
Obrigado amigo pelo seu excelente trabalho na divulgação dos nossos poetas e escritores.
Um abraço/Francisco.

redonda disse...

Comecei a lê-lo, mas depois interrompi a leitura e preteri-o por outros. Vou tentar retornar a ele nos próximos dias...

C. disse...

Olá Manuel :)

estava para aqui a pensar (zzzz) como é que chegas a estes, a outros, no fundo a qualquer livro?
vou tentar tirar esta pergunta da confusão que à partida possa parecer- quem acompanhe o teu blog há algum tempo verifica que, e traduzindo por miúdos, és um leitor experimentado e suficientemente (+++ ;p) crítico, também já deu para ver que és também um leitor descomplexado e com um grande sentido de humor- (não me equivoco muito até aqui, pois não?)
Agora, vamos a isto- a dada altura como leitores vamos traçando um caminho, vamos fazendo escolhas, sabemos que ao optar por um livro estaremos a deixar outro de parte (não há tempo para todos, mesmo que sejam só os melhores). portanto onde acho que quero chegar é em que é que te baseias quando seleccionas determinado livro, livros que mesmo na dúvida algo (mais a experiência que outra coisa, pronto um bocadinho de preconceito à mistura) te diz que não vão além do "médio" ( sim ^lê-se, e dependendo da perspectiva até se poderá retirar algum aspecto positivo da experiência)
bj ;)

Unknown disse...

Olá C.
Desculpa só responder agora mas estive uns dias "fora de serviço..."
A questão é pertinente mas tem uma resposta muito simples: a vida é demasiado curta para tantos livros; e é mais curta ainda para que se perca tempo com coisas que não prestam ou até para que se gaste tempo a arriscar inutilmente uma leitura de gosto duvidoso. Por outras palavras: o segredo está num bom critério de seleção, que eu acho que tenho. O que eu não sou capaz é de te dizer que critério é esse :) Eu leio apreciações de pessoas em quem confio (não dos críticos literários, note-se). Depois tenho por regra que um escritor consagrado é, naturalmente, um bom escritor. E depois acho que é uma questão de intuição e de experiência...
De facto, cheguei a uma fase em que raramente não gosto de um livro; porque acho que consigo "cheirar" a má qualidade entes de ler :)

Unknown disse...

C.
esqueci-me de dizer que neste caso a escolha foi do clube de leitura Bertrand, de Braga. Eu não conhecia o livro.